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sexta-feira, 11 de setembro de 2020

Canastra: a serra do queijo

(Por Arnaldo Silva) A Serra da Canastra, Sudoeste de Minas Gerais, guarda tesouros naturais de Minas Gerais, de grande importância para o Brasil. É onde nasce o Rio São Francisco, o rio da integração nacional. São várias nascentes e cachoeiras, uma rica flora nativa de Cerrado e Mata Atlântica e em sua fauna, espécies como o Logo-Guara, Jaguatirica, Onça-pintada, o Tatu-canastra, o Pato-mergulhão, o Tamanduá-bandeira, dentre outras espécies, podem ser vistos em seu habitat natural. 
          Para proteger esse patrimônio natural, foi criado em 1972, o Parque Nacional da Serra da Canastra. Um dos mais impressionantes santuários ecológicos do mundo, lugar dotado de uma beleza cênica impressionante! Mas porque Canastra? 
          Na região, formações rochosas e de enormes paredões são comuns. Uma dessas formações, chamou a atenção dos bandeirantes que na região chegaram no século XVII. Estes tinham como hábitos, nominar certas formações diferenciadas, que encontravam pelo caminho. Esses nomes serviam como sinalizadores e pontos de referência, como orientação em trajetos. (na foto acima, queijo Canastra feito pelo Mestre Queijeiro Roberto Soares do Rancho 4R, de São Roque de Minas)
          Dentre tantas formações rochosas existentes na região, uma chamou a atenção, por ter semelhança com um objeto muito comum em Portugal, uma arca retangular, bem rústica, usada para guardar roupas, cobertores e até mesmo, servia como mala, em viagens longas. O nome era canastra, em nossas terras, um baú. Assim o enorme penhasco passou a ser referência dos bandeirantes e viajantes que passavam pela serra, onde estava a Canastra. Assim ficou, Serra da Canastra. 
          Além das belezas naturais, das cachoeiras, das serras, montanhas e enormes paredões, há 200 anos é produzido na região um tipo de queijo, com o nome da serra. Os bandeirantes de origem portuguesa, em São Jorge, nos Açores, dominavam a técnica de produzir queijos e como na região existiam muitas pastagens, trouxeram gado e começaram a produzir o queijo que conheciam. (na foto abaixo de Wilson Fortunato, o maciço rochoso em forma de canastra, que deu origem ao nome da serra) 
As características do Queijo Canastra
          Essa receita de queijo sofreu adaptações devido ao clima, águas da Serra da Canastra, pastagem, manejo de gado, formação de bactérias, que dão sabor e textura aos queijos, são diferentes, assim, surgiu um queijo mineiro com identidade e estilo próprio.
          O Queijo Canastra tem sabor forte, picante, massa densa, bem encorpado, formando uma casca amarela clara, durante maturação. (na foto acima, Queijo Canastra do Rancho 4R, de São Roque de Minas, feito pelo Mestre Queijeiro Roberto Soares) 
          É um queijo único, não há igual no mundo. De sua receita original, características e modo de fazer, até os dias de hoje, pouca coisa mudou, apenas as adaptações às regras sanitárias. A tradição, os ingredientes, a forma como é feito, bem como seu valor histórico e cultural, foi reconhecido como Patrimônio Imaterial de Minas Gerais e também do Brasil, pelo IEPHA E IPHAN.
O modo de preparo do Queijo Canastra
          Essa forma, reconhecida como patrimônio dos mineiros e brasileiros, consiste no tradicional método de fazer este queijo que começa na ordenha, em seguida o queijeiro coloca o leite num enorme recipiente, sobre uma mesa, com uma leve inclinação. Em seguida é colocado o coalho e o “pingo”, uma espécie de fermento natural do próprio leite, que vai pingando aos poucos, com os pingos caindo num balde. 
          Quando o leite talhar, corta-se a massa, retira-se porções, que são colocadas em panos limpos e espremidos. Essa massa é colocada na fôrma para queijos, sem fundo, espremida novamente e por cima, coloca-se sal grosso.
          O queijo fica assim por 24 horas e nesse tempo, o soro do queijo vai escorrendo sobre a mesa, pingando nos baldes, sendo a matéria usado na produção seguinte. Depois desse tempo o queijo é desenformado e colocado em prateleiras arejadas, para ser maturado. Essa é a forma de fazer o Queijo Canastra. Mesmos ingredientes e mesma forma de fazer, como há 200 anos atrás. Queijo Canastra é simplesmente  leite cru, coalho, pingo e sal. (na foto do Roberto Soares, fôrma para queijos no Rancho 4R em São Roque de Minas) 
Maturação e armazenamento 
          Para uma peça desse queijo, de cerca de 1 kg, gasta-se cerca de 10 litros de leite e maturação que varia de 21, 30, 60, 90, 180 e até 360 dias. 
          Durante a maturação, uma casca grossa vai se formando sobre o queijo, que protege e preserva o sabor original do queijo. Essa casca deve ser retirada. O queijo está dentro da casca, mas se quiser, pode comer a casca grossa sem problema algum. (como podem ver na foto abaixo do Roberto Soares, do queijo Canastra do Rancho 4R, queijo com 6 e 12 meses de maturação).  Basta retirar a casca com uma faca, descartar a casca e degustar o queijo.
          Ao contrário do popular queijo Minas Frescal, um dos vários tipos de queijos que existem em Minas, queijo nenhum deve ir para a geladeira. O Frescal é de massa mole, próprio para consumo rápido, diferente do Queijo Canastra, de massa encorpada e firme.
          Queijos especiais devem ser armazenados em queijeiras, de madeira, não devem ser enrolados em plásticos e estar em temperatura ambiente. As queijeiras devem ter telas para proteger os queijos de insetos e para facilitar a circulação do ar, para que a maturação continue, bem como a preservação de suas características.
          Queijos finos em geladeira, perdem todo o processo adquirido em sua formação, além de suas características originais. Para aproveitar melhor o sabor e qualidade, o Queijo Canastra dever ser consumido após uma semana de maturação, quando o queijo já adquiriu um pouco de suas características. Melhor seria após 21 dias de maturação. O Canastra, quanto mais maturado, com a casca bem amarelada e seu mofo característico, é melhor, bem melhor. Combina super bem com vinho tinto e claro, café quente no bule.
Quais as cidades que produzem Queijo Canastra?
          Queijo Canastra só pode ter esse nome se for feito nos municípios que formam a Região Queijeira da Serra da Canastra. Para entender essa questão, precisamos entender bem o que é o nome Serra da Canastra. Na verdade, são três nomes, com significados diferentes. 
          Existe então a Serra da Canastra, um paredão no topo da serra (na foto acima da Maria Mineira). O Parque Nacional da Serra da Canastra, com cerca de 200 mil hectares, que é o nome dado a área e a Região da Serra da Canastra, uma região geográfica formada por 7 municípios produtores do Queijo Canastra. Deu para perceber que o mesmo nome tem três significados?
          A região queijeira da Serra da Canastra é formada pelos municípios de São Roque de Minas, Vargem Bonita, Medeiros, Piumhi, Delfinópolis, Bambuí e Tapiraí. Os produtores de queijos nesses municípios são orientados e organizados pela Aprocan (Associação dos Produtores de Queijo Canastra).
          Ou seja, Queijo Canastra legítimo são os produzidos somente nesses municípios, com selo e reconhecimento de Identificação de Origem (IG). O Queijo Canastra foi um dos primeiros produtos brasileiros a ter selo de comprovação de sua origem. O Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), concedeu o selo de Indicação Geográfica (IG) ao Queijo Canastra em 2012. Esse selo é importante constar no rótulo do queijo, para que o consumidor tenha certeza que está consumindo o legítimo Queijo Canastra.
Onde o Queijo Minas é produzido?
          O queijo mineiro ou o queijo Minas, não é apenas produzido na Região da Canastra, tem mais nove regiões queijeiras em Minas Gerais. São 10 ao todo.
          Os queijos mineiros são confundidos com a receita do popular Queijo Minas Frescal, o tipo de queijo mineiro, com massa mole e branco, mais consumido e o mais comum, dando a impressão que temos apenas um único queijo no Estado. Esse tipo de queijo é apenas mais um tipo de queijo que existe, dentre tantos outros queijos mineiros. (abaixo, Queijo Dinho, de Piumhi, um outro tipo de queijo Minas, com massa densa e furos no tipo emmental suíço. Foto de Lucas Rodrigues)
          São mais de 2 mil tipos de queijos produzidos no mundo todo e em Minas Gerais, são produzidos mais de 50 tipos de queijos, com nomes, cor, sabor, massa e texturas e receitas diferentes, como o tipos de queijos Canastra, Serra do Salitre, Araxá, Serro, Cabacinha, tipo de queijo do Vale do Jequitinhonha (na foto abaixo da Sila Moura), o queijo Cruzília, Diamantina, Alagoa, dentre outros tantos tipos de queijos, variações de receitas e nomes diferentes.
          Queijo Minas é denominação genérica, é referente a todo queijo artesanal, com origem em Minas Gerais, feito em Minas. Então, o queijo chamado Queijo Minas é apenas uma variedade de queijo, entre vários outros queijos feitos em Minas com características, texturas, cor, sabor, tempo de maturação, diferentes. 
As regiões queijeiras mineiras 
Região da Canastra Canastra: O tipo de queijo Canastra é produzido nos municípios de São Roque de Minas, Vargem Bonita, Delfinópolis, Medeiros, Piumhi, Bambuí e Tapiraí. 
Região da Serra do Salitre: O tipo de queijo Serra do Salitre é produzido no município Serra do Salitre e entorno, com destaque para os queijos com casca em resinas escura, amarela e vermelha, produzidos na Fazenda Pavão, do produtor João Melo, como podem ver na foto acima. 
Região de Araxá: O tipo de queijo Araxá é produzido nos municípios de Araxá, Tapira, Pratinha, Conquista, Ibiá, Campos Altos, Perdizes, Pedrinópolis, Medeiros e Sacramento (na foto acima do Luis Leite, queijaria da Fazenda  Caxambu em Sacramento). 
Região do Campo das Vertentes: O tipo de queijo Campo das Vertentes é produzido nos municípios de Barroso, Conceição da Barra de Minas, Coronel Xavier Chaves, Carrancas, Lagoa Dourada, Madre de Deus de Minas, Nazareno, Prados, Piedade do Rio Grande, Resende Costa, Ritápolis, Santa Cruz de Minas, São João Del Rei, São Tiago e Tiradentes.
Região do Cerrado: O tipo de queijo "Queijo do Cerrado" é produzido nos municípios de Abadia dos Dourados, Arapuá, Carmo do Paranaíba, Coromandel, Cruzeiro da Fortaleza, Guimarânia, Lagamar, Lagoa Formosa, Matutina, Patos de Minas, Patrocínio, Presidente Olegário, Rio Paranaíba, Santa Rosa da Serra, São Gonçalo do Abaeté, São Gotardo, Tiros, Varjão de Minas, Vazante.
Região do Serro: O tipo de queijo Serro é produzido nos municípios do Serro, Rio Vermelho, Serra Azul de Minas, Santo Antônio do Itambé, Materlândia, Sabinópolis, Alvorada de Minas, Dom Joaquim, Conceição do Mato Dentro e Paulistas. (na foto acima o queijo do produtor serrano, Túlio Madureira)
Região do Triângulo Mineiro: O tipo de queijo Triângulo Mineiro é produzido nos municípios de Araguari, Cascalho Rico, Estrela do Sul, Indianópolis, Monte Alegre de Minas, Monte Carmelo, Nova Ponte, Romaria, Tupaciguara e Uberlândia.
Região Mantiqueira de Minas: O tipo de queijo Mantiqueira de Minas é formado pelos municípios de Aiuruoca, Baependi, Bocaina de Minas, Carvalhos, Itamonte, Liberdade, Itanhandu, Passa Quatro e Pouso Alto.
Região Queijeira Diamantina: É uma região queijeira formada pelos municípios de Diamantina, Felício dos Santos, Gouveia, Datas, Couto de Magalhães de Minas, Presidente Kubitschek, São Gonçalo do Rio Preto, Senador Modestino Gonçalves e Monjolos, no Vale do Jequitinhonha.
Região Alagoa: O tipo de queijo Alagoa é produzido em Alagoa MG, Sul de Minas, é considerado uma região queijeira própria pela tradição e receita única de seu queijo, com origem no parmesão, desde o final do século XIX. Esse tipo de queijo não tem similar em lugar algum do mundo, por isso é uma região queijeira, formada apenas por este município. São vários os fatores que fazem desse charmoso município mineiro, com menos de 3 mil habitantes, uma região queijeira e única, por isso é a Região do Queijo Artesanal de Alagoa. (na foto acima, o Queijo Bela Vista, produzido na Fazenda Bela Vista, premiado com medalha de ouro no Mondial Du Fromage, na França, em 2019)
          Minas Gerais é o maior produtor de queijos do Brasil e o sexto maior do mundo e ter acesso ao queijo mineiro ficou mais fácil com a regulamentação da Lei nº 23.157 de 18 de dezembro de 2018, regulamentada por decreto, pelo Governo Mineiro, em 19/08/2020, criando regras sanitárias e legais para produção e comercialização dos queijos mineiros. Assim, os queijos de Minas Gerais poderá estar presentes nas gôndolas dos supermercados de todo o Brasil.

sábado, 5 de setembro de 2020

Duas cidades mineiras entre as mais descoladas do mundo

(Por Arnaldo Silva) Em 2020, o Creative Urban Institute, com sede em Portland, juntamente com a Universidade do estado de Oregon, ambos nos Estados Unidos, divulgaram para toda a mídia internacional, o resultado do índice internacional sobre o quanto as cidades tem de cool. Essa palavra inglesa, traduzindo significa, “legal”, descolada.
          O objetivo é saber o quanto uma cidade é legal e atrativa para o público jovem, chamado de hipster. Duas cidades brasileiras fazem parte desse índice: Tiradentes MG e Santa Rita do Sapucaí MG, que podemos ver na foto abaixo do Leonardo Souza/jleonardo_souza_srs)

          
Foram avaliadas 647 cidades de 20 países diferentes do mundo, tendo como base para medição do índice, o estilo de vida na era digital, usando 13 itens de pontuação, para grupos de 10 mil residentes, que são: festivais e eventos de tecnologias, micro cervejarias, provedores de internet de alta velocidade, condições de trânsito, número de startups de tecnologias, cafeterias, lojas familiares, alimentos disponíveis direto do produtor.
          E ainda, densidade de arte de rua, nível de ensino superior, renda per capita, inflação no preço de moradia do ano anterior e o interesse dos jovens pelo que acontece no dia a dia da cidade, com menções em hastags, chamada de “instagramabilidade”.
          O índice é medido nas cidades com menos de 130 mil habitantes.
          Com a medição desses índices, chegaram à listagem das cidades. Na lista entre as 10 cidades mais descoladas do mundo, surpreendentemente, duas são brasileiras, e mineiras: Santa Rita do Sapucaí, classificada na quarta posição e Tiradentes, na oitava posição no ranking mundial. (na foto acima do Deividson Costa, Tiradentes MG)
          Santa Rita do Sapucaí, conhecida como "cidade criativa", no Sul de Minas, segundo o IBGE, tem 43.753 habitantes, em 2020, foi destaque em startups, cafeterias, tecnologia e pelo HackTown, o festival de inovação e criatividade, que acontece no município, de grande prestigio internacional. (foto acima de Leonardo Souza/@@jleonardo_souza_srs)
          Já Tiradentes (na foto acima do César Reis), no Campo das Vertentes, contando hoje com 8.072 habitantes, em 2020, segundo o IBGE, foi destaque na avaliação por sua gastronomia e variedades de restaurantes, arquitetura histórica, galerias de arte e principalmente pelos festivais que a cidade organiza, durante o ano, como o Festival Internacional de Gastronomia, a Mostra de Cinema, Carnaval, Tiradentes Vinho e Jaz Festival, Tiradentes em Cena, Bike Fest, Trem Bier Festival, dentre outros.
Lista completa e em ordem das 10 cidades 
mais pontuadas no ranking mundial
1. Charleston (Estados Unidos) - 8.737 pontos
2. Mullumbimby (Austrália) - 8.437 pontos
3. Oss (Holanda) - 8.285 pontos
4. Santa Rita do Sapucaí (Brasil) - 7.824 pontos
5. Chiang Mai (Tailândia) - 7.797 pontos
6. Boulder (Estados Unidos) - 7.531 pontos
7. Leuven (Bélgica) - 7.489 pontos
8. Tiradentes (Brasil) - 7.391 pontos
9. Truckee (Estados Unidos) - 7.383 pontos
10. San Miguel de Allende (México) - 7.212 pontos

A história da Fazendinha da Regina

(Por Arnaldo Silva) Sempre postamos fotos de uma charmosa cozinha, com fogão a lenha, filtros de barro, canecas esmaltadas, café coado no coador de pano e com pratos da cozinha mineira, feitos na Fazendinha da Regina. E muita gente quer saber quem é a Regina, onde fica a Fazendinha. Por isso decidi fazer uma matéria especial sobre a Regina Kátia Rodrigues, da Fazendinha da Regina, ai na foto acima (arquivo pessoal) e na foto abaixo, do fotógrafo Eduardo Schneider, detalhes da mineiridade da cozinha da Regina.
          Regina, é mineira, nascida em Coronel Fabriciano, no Vale do Aço. Tem suas origens na roça, cozinha com fogão a lenha, quintal com pomar, galinheiro e muito espaço. Casou-se com o cearense Elizeu Silva. Deixaram Minas Gerais, com seu filho mais novo, rumo aos Estados Unidos, em 1992. O começo não foi fácil. Moravam numa quitinete, em Fourt Lauderdale, cidade costeira a 50 km de Miami, no estado da Florida. Nos Estados Unidos, Elizeu vendia verduras e Regina, cuidava da casa e trabalhava em casas de família. 
          País, cultura, culinária e língua, diferentes, tiveram que se adaptar ao estilo de vida americano. Mas mineiro, pode sair de Minas, mas Minas não sai do mineiro. Assim foi com Regina. A saudade de Minas, de sua família e de suas raízes, eram muitas. 
          Com o tempo e com muito trabalho, foram melhorando de vida e adquiriram um terreno, onde fizeram morada. No quintal, fizeram um fogão a lenha. A família aumentou e aos poucos também, o espaço de sua casa. (foto acima de Blake Pruttii)
          Regina, valoriza sua história e sua família, como todo mineiro. Sua família era numerosa, 9 pessoas, sendo 6 mulheres e apenas um homem, com o pai e sua mãe. Regina foi a quinta filha. Regina diz que passou boa parte de sua infância numa fazendinha, no interior de Minas Gerais. 

          Segundo Regina (na foto acima/arquivo pessoal), onde vivia, era “um lugar muito lindo, com flores silvestres, beija-flores, horta, jardim, leite fresco de manhã, cachoeiras, um lugar lindo e mágico. Tínhamos fogão a lenha do lado de fora da casa. A partir das 7 horas da noite, o sino começava a tocar, e assim de hora em hora para todos as pessoas da região, saberem as horas. Minha mãe era a professorinha das crianças da vila.
          Todos se conheciam e meu pai era respeitado, sendo ele o chefe da vila. Saíamos as vezes com ele pela vila à noite. com pijamas de flanela. As pessoas falavam: lá vem o Didico e suas filhas, já que meu irmão mais novo ainda não havia nascido. Meus pais são minha inspiração. Eles faziam de tudo para que a nossa infância fosse um conto de fadas, e foi esse lugar que me inspirou a fazer uma réplica de uma fazendinha aqui na Flórida. Depois meu Pai foi transferido para uma cidadezinha linda e poeirenta, chamada Coronel Fabriciano, para se tornar o empreiteiro da companhia Belgo Mineira.” 
          Continuando a história, Regina diz que “aos 18 anos de idade tive um encontro pessoal com Jesus, fui para o seminário evangélico, e lá conheci meu amado e eterno namorado, Elizeu. Passei 4 anos no seminário, e o ano prático como missionária dentro da selva Amazônica, em uma pequena cidade, e o Elizeu também na Amazônia, mas em outro estado. Nos casamos em 1987, fomos morar na cidade do meu marido, Fortaleza, no Ceará, um outro estado no nordeste de Brasil, 2.000 KM distante do meu estado. Foi lá que nasceu o nosso amado e querido filho, Caio. Viemos para os USA em 1992, e em 1993 nasceu o nosso amado e querido Matthew”, conclui o resumo de sua história. Na foto acima, os pratos servidos na Fazendinha da Regina e abaixo, Regina, seu esposo, Elizeu Silva e seus dois filhos. (arquivo pessoal)
          Hoje a Fazendinha da Regina é um sucesso e lugar muito frequentado, tanto por mineiros, brasileiros e americanos, mas o começou não foi fácil, garante Regina, que relembra: “Quando viemos para os EUA, eu sentia muita saudade do Brasil, e nunca estava feliz. O tempo foi passando, nos legalizamos, as crianças crescendo e vi que não podia mais voltar. O Elizeu ficava triste ao me ver assim, infeliz, chorando pelos cantos. Então pensei que se não podia voltar, poderia trazer o Brasil pra mim. Então decidi ser feliz aqui! A felicidade não pode depender de onde se vive."
          Decidindo ficar de vez nos Estados Unidos, Regina e Marido criaram um espaço onde podiam lembrar um pouco do Brasil, de Minas Gerais e da própria infância de Regina, criada na roça, à beira de um fogão a lenha. Se esforçaram para trazer um pouco de Minas para a Flórida, com um pouco do estilo de viver do mineiro, bem como sua culinária e tudo que uma cozinha e quintal mineiro, tem.
          Assim, afirma Regina, “Pedi ao meu marido que construísse um fogão a lenha no nosso quintal e um galinheiro, e tudo que eu sonhava, mesas, balanços, trenzinho." 
          Elizeu não mediu esforços para amenizar a saudade da esposa, de sua terra natal. Diz Regina que, seu marido, “Fez os meus sonhos se tornarem realidade antes mesmo que eu terminasse de sonhar. Começamos a entreter as pessoas da igreja e amigos, fazendo caldos e comida no fogão a lenha. Em 2006 os eventos começaram a ser mais frequentes, depois que os brasileiros nos viram no Facebook e em alguns jornais brasileiros. Em 2013 estabelecemos a Fazendinha oficialmente, com licença de uma ONG, sem fins lucrativos, a nível estadual e federal. Nos dedicamos a levantar fundos para nossa igreja, Las Olas Worship Center – reformas da igreja, missões, atendendo às necessidades pessoais de alguns, além de ajudar outras entidades.”
          Elizeu é pastor da Assembleia de Deus Americana e Regina e filhos, o auxiliam nos trabalhos da igreja. 

          Hoje a família tem sua própria moradia nos Estados Unidos, adquirida com muito esforço e trabalho. É uma construção antiga, em estilo rústico, toda em madeira e com lareira. O casarão é tombado pelo patrimônio público americano. Fica apenas 5 km de Fort Lauderdale, cidade na costa sudoeste da Flórida, apenas 50 km de Miami. 
          Transformaram o espaço num cantinho de Minas nos Estados Unidos, como podem ver na foto acima do Eduardo Sch, com fogão a lenha, que é o charme e atração da fazendinha, canecas e bules esmaltados, prateleiras, linguiça defumando na vara, sobre o fogão, galinheiro, ovos frescos, galo cantando ao amanhecer, crianças brincando no quintal, bancos e mesas para uma boa prosa e mobiliário que lembra as típicas e charmosas cozinhas de Minas, e claro, as delícias da cozinha mineira. 
          O lugar é charmoso, pitoresco, aconchegante, que lembra em tudo uma fazenda e por isso nome, Regina´s Farm, traduzindo, Fazendinha da Regina. Sem contar a hospitalidade característica do povo mineiro, presente na Regina Kátia. A família é muito acolhedora. 
           A Fazendinha da Regina, atrai os mineiros que vivem na Flórida, que tem no lugar um espaço para relembrar Minas Gerais e saborear os mais deliciosos pratos de Minas. Mas não são apenas mineiros e brasileiros que frequentam o local. Americanos e gente de outras nacionalidades, também, atraídos pelo charme da cozinha da Fazendinha da Regina e pelo sabor da cozinha de Minas Gerais. 
          Regina levanta bem cedo e já começa a preparar seus pratos para os convidados que agendam presenças. Prepara o café, coado no coador de pano, a beira do fogão a lenha, com pão de queijo, bolo de fubá, biscoitos, pães caseiros e roscas. Em seguida, começa a preparar o almoço, que tem Vaca Atolada, Rabada, Tutu de Feijão, Feijão Tropeiro, Escondidinho de mandioca, carne seca, couve, angu, chuchu, arroz de carreteiro, galinhada, frango, caldos, pudins, doces e vários outros pratos, que surpreendem os americanos, que adoram. 
          Mesmo vivendo num pais que a acolheu bem, tendo amigos, um lar que retrata Minas Gerais, Regina e família vem sempre ao Brasil. Segundo Regina, quando aqui está, “esqueço dos Estados Unidos, e só quero viver os meus momentos preciosos e curtos que passo ai no Brasil. Eu vou em Fortaleza, na terra do Elizeu, e depois Espirito Santo, aonde meu Pai morava, porque agora não vamos mais, porque ele faleceu, em janeiro passado. Depois vamos para Minas Gerais, o nosso lugar favorito, até mesmo do Elizeu. Vamos dirigindo, porque o Elizeu adora ver as estradas, as montanhas, porque não tem montanhas em Fortaleza. Eu quero ver tudo, tocar em tudo, comer nos restaurantes que tem fogão a lenha nas estradas. 
          Eu vivo cada momento como meu último. Minha família fica feliz em ver a minha felicidade. em estar no Brasil querido, vou ao mercado central em BH, na feira hippie, nos mercados, nos botecos, nas estradas de Ouro Preto. Na cidade de Ouro Preto, compro copinhos esmaltados, vestidos, sandálias e botinas. Tomo o cafezinho oferecido na bancada dos restaurantes e lanchonetes. Como cenoura baroa, que adoro. Eu simplesmente esqueço dos Estados Unidos, e quero viver somente aquele momento. 
          Minha linda Minas Gerais cheira mato, montanhas, queijo, cheira povo simples, café, fogão a lenha, prosa, mesa farta, família, acolhimento, pão de queijo, galo cantando, curral e canarinho. Eu preciso desses momentos para me fortalecer, e agradecer de onde vim, nada pode comparar com meu Brasil, minha Minas Gerais!” Garante Regina. 
          E continua: “Fico feliz também em Fortaleza, amo ir lá! Curto tudo, experimento tudo, os sucos, as comidas típicas, os mercados, as praias, vendo os pescadores voltando as 4 da manhã, com os peixes nas barcas de vela, no Mucuri, amo o sotaque, tudo. Mas o melhor de todos e quando vamos para Minas Gerais!!!!!!! Eu e Elizeu, amamos Minas Gerais!” 
          É esse sentimento de ser mineiro que Regina leva para os americanos e faz renascer nos mineiros que vivem nos Estados Unidos. Regina afirma foi esse sentimento que “quis trazer para minha casa, queria que as pessoas que viessem aqui, sentissem da mesma maneira em que me sinto ai, em Minas Gerais. Queria que se sentissem em casa, estar na casa da mãe, tia, que eles se sintam em casa. E a sua casa na minha casa! Esse calor que não se vê muito aqui na América." 
          A Fazendinha foi concebida para amenizar a saudade de Regina de Minas Gerais, mais hoje é mais que isso. É a casa dos mineiros na Florida. É a casa dos mineiros na casa dela, como ela mesma diz.
          “A casa deles na minha casa! Sua casa na minha casa! Assim eles passam uma tarde reunidos em uma mesa, compartilhando o pão, as crianças correndo junto com as galinhas, o fogão a lenha com os caldos, passando café, o cheiro da lenha, o pão de queijo, balanços, gangorras, e as pessoas esquecem por algumas horas tudo lá fora, e se sentem como se estivessem ido ao Brasil, sem ter preciso pegar o avião. 

          E sentem o cheiro e a vida por um pouquinho de Minas Gerais. Aqui eles fazem amigos, encontram amigos, fazem amigos, repartem a mesa com estranhos, criam novos amigos, bebem vinho debaixo do morrer do sol e da lua. Vem pessoas de todos os cantos do mundo, não somente brasileiros, mas de todas nacionalidades. Colocamos músicas do Zé Ramalho e Fagner. Sinto que a Fazendinha é como Minas Gerais é para o Brasil, o mediador, de Norte e Sul do Brasil. A Fazendinha seria mediador entre nacionalidades. Todos juntos em um só lugar, dividindo o pão, bebendo o vinho, como um santuário”, conclui Regina, com orgulho e emoção. 
          A fazendinha da Regina é, segundo ela mesma define, onde “as famílias se divertem, as crianças correm, brincam à vontade de forma segura. Uma alegria que temos é ver nossos compatriotas matarem a saudade do Brasil que eles sentem, da mesma forma que senti e ainda sinto, e também ver que os Americanos e pessoas de todas as partes do mundo se apaixonando pelo Brasil sem nem mesmo precisar viajar. (foto acima de Toddy Roland)
          Agora o meu coração está dividido entre o Brasil e a América que aprendi a amar, e que me adotou como filha, e sou muito grata!! 
          Sou grata a Deus pelos meus dois países que tenho agora. Sei com toda certeza que a Fazendinha foi um projeto partido do Coração de Deus, e a Ele toda a minha gratidão. Nosso desejo é que todos se sintam em casa. É a sua casa na nossa casa!" (foto acima de Blake Pruttii)
          A Fazendinha da Regina está nas redes sociais, com fanpage no Facebook e perfil no Instagram, com o nome “Regina´s Farm”. As visitas são agendadas e todos serão bem vindos!
As informações, bem como todos as fotografias para esta edição, foram enviadas pelo casal Regina Kátia e Elizeu Silva.

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Caminho da Luz: o caminho do Brasil

(Por Arnaldo Silva) Quando da chegada das caravelas de Cabral ao Brasil, acredita-se que existiam uma média de 3 a 8 milhões de índios em nossas terras, falando 1300 idiomas diferentes e divididos em 1400 tribos. 
          A presença indígena no Brasil se resume atualmente a cerca de 380 mil índios, distribuídos em 125 etnias e falando 180 línguas. Até o século XVI, o território mineiro era ocupado por cerca de 100 grupos indígenas e outras centenas de povos indígenas nômades. 
          Hoje, são apenas 13 etnias presentes no Estado, que são: Aranã, Catu-Awá-Arachás, Kaxixó, Kiriri, Krenak, Maxakali, Mucuriñ, Pankararu, Pataxó, Pataxó Hã-Hã-Hãe, Puris, Tuxá, Xacriabá, Xukuru-Kariri. Os indígenas que ocupavam a região da Zona da Mata Mineira, eram os Carajás e os Botocudos, do tronco linguístico macro-jê. 
          Os indígenas que viviam nessa região, consideravam o topo do que é hoje o Pico da Bandeira (na foto: Abraluz/Divulgação), em Alto Caparaó MG, um lugar sagrado. Isso porque, no topo da montanha, habitava, segundo a crença primitiva dos índios, Ruda, o deus da criação. Para chegar até a montanha sagrada, abriram trilhas pelas matas, numa caminhada feita durante dias, por 195 km, parando em alguns lugares, para fazer rituais de purificação para estar em contato com a divindade, no topo da montanha sagrada. 
          O modo de vida e caça dos indígenas, existe há milhares de anos, bem como suas crenças e rituais. O mesmo caso podemos dizer sobre o caminho aberto pelos indígenas na Zona da Mata, com início na Cachoeira de Tombos, até o todo da montanha, que eles consideravam sagrada, o Pico da Bandeira.  (Abaixo a cidade de Tombos MG.Foto: Abraluz/Divulgação) 
          Não há como precisar quando foi aberto, e nem a frequência que com faziam a caminhada até a montanha, já que a presença indígena data em Minas Gerais de milhares de anos atrás, bem como os registros de rituais e modo de vida, deixados em pinturas rupestres encontradas em cavernas de Minas Gerais e do Brasil e em vários sítios arqueológicos em regiões mineiras, onde foram encontrados igaçabas, objetos de caça e utensílios usados pelos índios em seu dia a dia, mostrando um pouco de seus modos de vida e sobrevivência, bem como suas crenças, práticas e rituais. 
          Segundo estudos, os índios brasileiros são descendentes dos povos asiáticos, chegando ao nosso continente pelo estreito de Bering, há cerca de 62 mil anos. Já a presença indígena no Brasil, segundo estudos arqueológicos recentes, aponta que a chegada dos primeiros habitantes brasileiros, data entre 20 mil e 40 mil anos, com vestígios desses povos encontrados entre o litoral da Bahia e Piauí. Com o passar dos milênios, esses povos foram se expandindo para o todo o território brasileiro, sendo em Minas, sua presença estimada entre 12 a 20 mil anos atrás.
          Com a chegada das entradas e bandeiras, acompanhadas de religiosos, em busca de ouro no nosso território, chegaram também doenças, violência e morte para os povos indígenas, além da escravidão. Os que sobreviviam nas invasões dos brancos, era capturados e chamados de carijós, na tradução, escravos. Boa parte dos carijós eram convertidos ao cristianismo e ainda, misturavam-se com brancos e negros, ocorrendo assim a miscigenação, perdendo os carijós com isso, sua identidade, como povo.
          Já no século XVIII, a presença indígena no nosso território tinha sido praticamente contida, com os povos que restaram fugindo para lugares distantes da presença dos colonizadores e reconstruindo, do que restou, suas comunidades.

          O caminho aberto pelos índios passou a ser usado por tropeiros e aventureiros, que vinham do Rio de Janeiro com destino ao Espírito Santo, ou mesmo para as tropas adentrarem-se no sertão mineiro, até os vales do Rio Doce, Mucuri e Jequitinhonha, pegando caminho para a Bahia, a partir do século XVIII. Com o fim das tropas, chegada da estrada de ferro e por fim, abertura de estradas, esse caminho acabou não sendo mais usado.
          Com o objetivo de resgatar o passado dos povos primitivos brasileiros, os índios, bem como a história que envolve o caminho, a partir do século XVIII, no final da década de 1990, um grupo de abnegados, entre eles, Albino Neves, se dedicou a pesquisar e estudar o caminho feito pelos índios, bem como todo seu percurso, do início em Tombos, até Alto Caparaó MG. (foto acima: Abraluz/Divulgação, o mapa de todo o caminho) O objetivo era recuperar o caminho original feitos pelos índios e resgatar um pouco de nossa história. A partir de 2001, começou a ser todo restruturado, e adaptado para ser feito novamente, com exatidão, o mesmo caminho, com mais conforto e segurança para os caminhantes.
          Quando o caminho foi recuperado, percebeu-se que ao longo de toda a trilha, brotavam da terra, cristais e pedras de mica, minerais reluzentes, que brilhavam como a luz, emanando uma mágica energia direto da terra, se espalhando pelas matas e rios, revigorando as forças dos caminhantes. Por isso o nome Caminho da Luz. (foto acima: Abraluz/Divulgação, em Caiana) Além da mica e cristais, pelo caminho podem ser encontradas ainda outros tipos de pedras, como ágata, minério, ouro de tolo, feldspato, caulim, bauxita, dentre outros minerais 
          O Caminho da Luz é hoje um dos principais atrativos turísticos do Estado e Patrimônio Cultural de Minas Gerais, desde 2009, através da Lei Estadual nº 18.086/09. De Tombos até Alto Caparaó, o caminho é todo sinalizado com setas amarelas e placas (foto acima e abaixo: Abraluz/Divulgação)
          Assim, o antigo caminho feito pelos índios, voltou a ser feito por peregrinos, ambientalistas, cavaleiros, ciclistas ou mesmo, quem gosta de uma boa caminhada.
          São 195 km, com saída da Cachoeira de Tombos (na foto acima do Sérgio Mourão), passando pelos municípios de Catuné, Pedra Dourada, Faria Lemos, Carangola, Caiana, Espera Feliz, Caparaó, por fim, em Alto Caparaó, até o topo do Pico da Bandeira, o ponto mais alto de Minas Gerais, com 2792 metros de altitude. Durante o percurso, os caminhantes tem o privilégio de passar por cidades charmosas, santuários religiosos, matas nativas, cachoeiras e antigas estações de trem, além de poder conhecer um pouco da cultura, história e culinária de cada cidade.
          O antigo caminho feito antigamente pelos índios, é hoje uma tradicional rota peregrinação que atrai pessoas de Minas Gerais, do Brasil e do mundo. São pessoas que fazem o caminho por diversos motivos, como, religioso, para os que querem manifestar sua fé, visitando os santuários religiosos das cidades ao longo do percurso ou mesmo, para pagar alguma promessa, fazendo o Caminho da Luz, a pé. (foto acima e abaixo: Abraluz/Divulgação)
          E caminhando a pé, sempre estão os ambientalistas, que fazem o percurso com o objetivo de conhecer as paisagens, fauna, flora e belezas da região e os apaixonados pela riqueza de nossa história, presente na região, de forma significativa, que remonta à presença indígena e colonização portuguesa, Tem ainda os amantes de esportes como, ciclistas, que fazem o percurso de bicicleta, bem como os que preferem ir à cavalo, em grupos de cavalgada. Por ser um percurso longo, é aconselhável não fazer o Caminho da Luz sozinho, mas em grupos. 
          O Caminho da Luz é administrado pela Associação Brasileira dos amigos do Caminho da Luz – Abraluz, tendo como presidente, Albino Neves. Desde 2001, a entidade cuida do credenciamento, sinalização e outros detalhes, para que os caminhantes façam o trajeto com tranquilidade e segurança. A sua organização e estruturação, tem como inspiração, o “Caminho de São Tiago de Compostela”, na Espanha.
          O credenciamento é feito na cidade de Tombos, junto a Abraluz. Algumas agências de turismo, credenciadas pela entidade, oferecem pacotes fechados. A caminhada é feita todos os anos, organizada pela Abraluz e realizada sempre no terceiro domingo de julho, com inscrições feitas no Hotel Serpa, em Tombos. O caminho pode ser feito fora dessa época, por grupos de pessoas, orientados e credenciados pela Abraluz.
          Após a inscrição, o participante receberá uma credencial. É necessária, porque o caminhante terá que passar por propriedades particulares e a credencial, que seria um tipo de passaporte, permitirá que continue o percurso, ao apresentar a credencial nas propriedades particulares que exigirem. Em cada passagem, a credencial será carimbada.
          Para aproveitar melhor o Caminho da Luz, as belezas das paisagens ao longo de todo o percurso, das cidades, da culinária típica, do artesanato e da hospitalidade do povo da região, o ideal são 7 dias de caminhada, com tempo para almoço, café, jantar, pernoite e claro, aproveitar para conhecer melhor as cidades do Caminho da Luz. De bike e a cavalo o tempo do percurso é menor, mas o passeio mais emocionante é a pé, saindo logo de manhãzinha, após o café da manhã. A sugestão é dividir os 7 dias dessa forma:

1º Dia: No primeiro dia, bem cedinho, a concentração é na Cachoeira de Tombos (na foto acima - Abraluz/Divulgação). Com 62 metros de queda, é a maior da Zona da Mata e a quinta em volume de água no Brasil. A cachoeira impressiona pela beleza, bem como uma escultura, feita pelo escultor Afonso Barra, patrocinado por Albino Neves, em homenagem aos índios. A cidade de Tombos, distante 370 km da capital, conta hoje com cerca de 10 mil habitantes. É charmosa, singela, atraente, aconchegante, com construções charmosas, como a sua antiga Estação de Trem, hoje Museu Municipal, o secular Hotel Serpa, a Fazenda Oliveira, do século 19 e outros atrativos naturais e arquitetônicos. 
          De Tombos, o primeiro destino é Catuné, o maior distrito tombense, numa caminhada de 19 km por entre belíssimas paisagens naturais, que dá oportunidade de conhecer a fauna e flora da região, além de passar por fazendas de café e serras, que permitem uma vista privilegiada do entorno, bem como conhecer a Gruta da Pedra Santa, dedicada à Nossa Senhora de Lourdes (na foto acima: Abraluz/Divulgação). Um monumento, com imagem da santa abençoando uma peregrina está exposta na gruta. A obra foi esculpida por Afonso Barra, patrocinada pela Abraluz, através de seu presidente, Albino Neves. Deixando Cafuné, o destino seguinte será Pedra Dourada, numa caminhada de 22 km.
2º dia: Até Pedra Dourada, o trajeto é pura emoção e beleza, passando por paisagens nativas, montanhas, o Santuário da Água Santa e as águas minerais e curativas que jorram das pedras e refrescam a caminhada. Pedra Dourada é uma pacata e pitoresca cidade com cerca de 2500 habitantes. (foto acima de Brunno Estevão)
          A cidade é um charme, com destaque para a pedra que deu nome à cidade, a Pedra Dourada, que à luz do sol, fica na cor dourada, além da Pedra Redonda, (na foto acima do Brunno Estevão) No município, tem ainda belas cachoeiras, matas contínuas de Mata Atlântica, o famoso Parque São João e a Igreja de São José, única em estilo neogótico na região, tendo uma estátua de 2.30 metros em sua frente, com obra do escultor Afonso Barra patrocinada pela Abraluz e Albino Neves, em parceria com a Prefeitura Municipal. 
          Antes de partir para o próximo destino, que é Faria Lemos, vale a pena ir até o Sítio Pedra Dourada, na Comunidade das Favas, para uma parada na casa da dona Ercilene (na foto acima do Brunno Estevão), famosa quitandeira da região onde o visitante pode tomar um café com pão de queijo, rosca, broa, biscoitos, além de prosear bastante. Dona Ercilene e seu esposo são pessoas carismáticas, hospitaleiros, muito educados e ficam felizes com a presença dos peregrinos na comunidade. Em sua casa, todos fazem questão de experimentar uma das mais deliciosas iguarias da Zona da Mata, a pelinha de angu frita. Depois de sair da casa da dona Ercilene, é hora de rumar para Faria Lemos. São 25 km de caminhada. 
3º dia: No caminho para Faria Lemos está a belíssima Cachoeira do Varandão, ainda em Pedra Dourada (na foto acima:Abraluz/Divulgação), e na sequência da caminhada, já em Faria Lemos, tem a Cachoeira da Surpresa, linda, refrescante e ótima para a prática de rapel, além da Pedra do Lagarto. Nesse lugar, segundo a tradição oral, vivia isolado um velho e sábio pajé, que na cultura indígena, é aquele que tem contato com o mundo dos espíritos, tendo o dom da cura e domínio sobre as plantas medicinais. Vivia uma vida completamente ligada à natureza, recitando cânticos e louvores à mãe natureza. Um lugar místico, mágico e cheio de energias positivas.
          A cidade de Faria Lemos, hoje com menos de 4 mil habitantes, é uma cidade pacata e tranquila, popular na região por praticamente todos os seus habitantes terem um apelido. (na foto acima Abraluz/Divulgação, fazenda centenária em Caiana) Se destaca na agricultura, principalmente pecuária leiteira e por sua cachaça, como a produzida na centenária fazenda das Palmeiras.
          Tem ainda a beleza da Serra Azul, com seu pico a 1430 metros de Altitude e o rio Carangola e o ribeirão São Mateus, que banham o município.
          A Igreja Matriz de São Mateus, é outro destaque, única construída em estilo grego-românico na região. Em sua porta, um monumento em homenagem a São Mateus, à criança peregrina e ao afrodescendente, esculpido pelo escultor Afonso Barra, com patrocínio da Abraluz, através de seu presidente, Albino Neves. De Faria Lemos, o destino seguinte é Carangola, com 23 km de caminhada. (foto acima: Abraluz/Divulgação)
4º dia: O Caminho da Luz segue de Faria Lemos, passando pelo Córrego do Inhame, belas fazendas, pela Serra dos Cristais até chegar à Princesinha da Zona da Mata, Carangola (na foto acima de Terezinha Ognibene), uma cidade que guarda relíquias da presença indígena na região, como igaçabas, utensílios em cerâmicas, dentre outros objetos, encontrados em sítios arqueológicos do município. Uma das mais antigas cidades da Zona da Mata, Carangola tem suas origens no início do século XIX e conta com belíssima arquitetura urbana, guardando ainda traços arquitetônicos do período colonial, bem como da sua charmosa arquitetura eclética e neoclássica, tradicionais no final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX. 
          A cidade conta com cerca de 35 mil habitantes e é dotada de uma ótima estrutura urbana, belas praças, paisagens lindas, uma rica e típica culinária mineira, bem como fazendas centenárias e charmosas vilas coloniais, em sua zona rural (na foto acima da Terezinha Ognibene, a capela de São Manoel, na comunidade de mesmo nome).  Tem ainda Matriz de Carangola, dedicada a Santa Luzia. Na porta da Matriz, foi colocado um monumento de 2,30 metros de altura, feito pelo escultor Afonso Barra, com um fiel, cego, pedindo bênçãos à santa. A obra foi doada pela Abraluz. Partindo de Carangola, nosso próximo destino é Caiana, com 26 km de caminhada. (foto abaixo: Abraluz/Divulgação)
5º dia: Esse percurso é considerado o mais belo do Caminho da Luz, além de passar por trechos e construções da antiga Estrada de Ferro Leopoldina, tem no caminho, paisagens impressionantes. Dificilmente os caminhantes não param para contemplar as belas desse trecho. São nascentes, córregos, mata nativa, a mina de cristais, a fonte Santa Clara, passando por belos paredões rochosos das montanhas mineiras, com o privilégio de ver nesses paredões, plantas nativas como orquídeas, avencas, bromélias, samambaias, dentre outras. Sem contar que é um trecho de altitude, que permite vislumbrar as belezas das montanhas de Minas, do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. 
          A cidade de Caiana (na foto acima de Elpídio Justino de Andrade) é bem pacata e aconchegante, emana uma energia que brota da terra, onde concentram-se minério, mica, cristais e além de pedras semipreciosas. Tem cerca de 6 mil habitantes, que vivem numa cidade bem organizada, com um povo muito bom e acolhedor. A Abraluz se faz presente no município, tendo doado ao município, um monumento dedicado a São João Batista, padroeiro de Caiana. O monumento esculpido por Afonso Barra, homenageia o peregrino idoso e os Templários, protetores dos peregrinos da Terra Santa. De Caiana, o destino é Espera Feliz, apenas 7 km de caminhada.
          Espera Feliz (foto acima de Elpídio Justino de Andrade), que além de ter este romântico nome, é conhecida também como “Cidade das Flores” e “Terra Fria. Na caminhada até a cidade, tem pelo caminho rios e cachoeiras belíssimas, com águas limpas e cristalinas. Uma cidade famosa por produzir um dos melhores cafés do Brasil, além de ser charmosa, muito bem estruturada, com bares e restaurantes típicos, além de seu casario e arquitetura elegantes, como a antigas estações de trem na cidade e em Pedra Menina. 
          Tem ainda a Igreja de São Sebastião e o monumento ao cavaleiro peregrino, na porta da igreja, esculpido pelo escultor Afonso Barra, com patrocínio da Abraluz, através de seu presidente, Albino Neves. (na foto acima Abraluz/Divulgação, um riacho entre Faria Lemos e Carangola) A cidade é muito bem estruturada, com belíssimas paisagens e uma culinária que vai atrair a todos. Doces e quitandas da cidade, nem se fala, são deliciosos. Espera Feliz é um lugar muito gostoso para pernoitar. No dia seguinte, nosso destino é Caparaó, com 13 km de caminhada. 
6º dia: No seguinte, bem cedinho, o destino é Caparaó, uma cidade pequena, com cerca de 6 mil habitantes, mas muito bela, aconchegante, povo hospitaleiro e terra de café, reconhecido no mundo inteiro por sua qualidade. Pelo caminho até Caparaó, o caminhante passará por uma impactante montanha, numa pitoresca comunidade chamada de Pedra Menina. (na imagem, Caparaó. Abraluz/Divulgação)
          Outra comunidade no Caminho da Luz é Galileia, pertencente a Caparaó, lugar de parada dos índios antes da subida até o topo da montanha, onde está hoje o Pico da Bandeira. Paravam onde é atualmente, esta comunidade, aos pés das montanhas. Descansavam e se preparavam para um ritual de purificação, antes de estarem subirem até o pico, em contato com a divindade que acreditavam viver no topo da montanha sagrada.
           No alto do Pico da Bandeira (na foto acima: Abraluz/Divulgação), a sensação é de estar acima das nuvens, literalmente no céu, impressiona e emociona. Os índios faziam todo esse percurso, movidos pela fé e agradecimento, além de reverenciar e fazer suas orações, rezas e rituais, no lugar onde acreditavam viver a divindade da criação. 
7º dia: No sétimo dia, em Alto Caparaó, cidade considerada a porta de entrada para o Parque Nacional do Caparaó, em Minas Gerais, vale a pena conhecer um pouco mais dessa charmosa cidade. Alto Caparaó (na foto acima de Terezinha Ognibene) conta hoje com cerca de 6 mil habitantes, com seu povo formado no início do século XX, por imigrantes que chegaram ao Brasil no final do século XIX, vivendo em Nova Friburgo/RJ. Percebendo semelhança da região de Alto Caparaó com as paisagens europeias, alguns desses imigrantes deixaram Nova Friburgo, a partir de 1900 e fundaram um pequeno arraial, se juntando aos alemães, suíços, italianos e portugueses, além de mineiros e brasileiros de estados vizinhos, dando origem ao que é hoje, a cidade de Alto Caparaó.
          Na chegada à cidade, o caminhante recebe o último carimbo em sua credencial e o Certificado de Caminhante da Luz, concedido pela Abraluz. 

          Alto Caparaó é tão especial que estar na cidade já é um privilégio. Suas belezas naturais são impressionantes, como cachoeiras, matas nativas, poços paradisíacos, como os do Vale Encantado (na foto acima do Marcelo Santos), a parte mineira do Pico da Bandeira, com 2892 metros de altitude, onde está o topo, além de outro importante pico, com 2790 metros de altitude, o Pico do Cristal. (na foto abaixo do Sairo C. Guedes)
          A sugestão é aproveitar um pouco mais a cidade, conhecer seu povo, as igrejas de São Paulo Apóstolo e da Imaculada Conceição (na foto abaixo do Thelmo Lins), suas praças, bares, cafeterias, sítios e fazendas de café, seus produtos artesanais como cachaças, queijos, doces e cervejas, além de sua culinária e seu povo, que é muito acolhedor. 
A cidade é dotada de uma ótima rede hoteleira, com pousadas charmosas e aconchegantes, além da própria cidade ser uma das mais belas do circuito. Tranquila, pacata e de tradição cafeeira. No último concurso nacional de café, o café produzido no Sítio dos Tucanos ficou em 1º lugar, como o melhor café do Brasil. Os cafés especiais de Alto Caparaó são de altíssima qualidade e famosos no mundo. 
          Outro ponto interessante para se conhecer na cidade é o Marco do Triunfo (na foto acima: Abraluz/Divulgação), uma escultura toda em ferro, que fica em frente ao Restaurante Estância Gourmet, com detalhe na escultura do símbolo do Caminho da luz, o Caminho do Brasil.           
          Finalizando o Caminho da Luz, nosso destino final é subir os 2892 metros de altitude do Pico da Bandeira (foto acima do Thelmo Lins). O ideal é levantar de madrugada e subir até o topo do pico, a pé para aproveitar e assistir um dos maiores espetáculos naturais, o nascer do sol. 
          É tão belo que os índios consideravam o lugar sagrado. A impressão é de estar acima das nuvens, no céu, perto da divindade maior. Não tem quem não se impressione com a beleza e vista. A subida é de 18 km e durará em média, 2 horas. (foto acima de Marcelo Santos e abaixo de Sérgio Mourão)
          Assim encerramos nosso roteiro. Esse é o Caminho da Luz.
Agradecimento: Ao jornalista, escritor, idealizador do Caminho da Luz e Presidente da Associação Brasileira Caminho da Luz, Albino Neves, nosso agradecimento pelo apoio e gentileza por ceder pertencentes à entidade, que ilustram a matéria.

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