Arquivo do blog

Tecnologia do Blogger.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Picada de Goyáz: história, revitalização e turismo

(Por Arnaldo Silva) Antes da chegada de bandeirantes e portugueses no território mineiro, todo o Estado era ocupado por diversas etnias indígenas. Os índios abriam picadas nas matas ligando tribos, ou mesmo, a lugares que consideravam sagrados, como picos e topos de montanhas.
          Com a descoberta de ouro em Minas Gerais no início do século XVIII, as picadas abertas por índios começaram a ser usadas pelos bandeirantes e com seu trajeto ligado e ampliado, quando foram encontradas minas de ouro na região habitada por indígenas da etnia Goyazes, na Região Centro Oeste do Brasil. (na imagem acima de Arnaldo Silva, parte do Caminho Velho da Picada de Goiáz no Garça, em Bom Despacho MG)
          Para escoar as riquezas do território goiano, as antigas picadas dos índios foram sendo unificadas em um só caminho, começando em Sabará MG, cidade histórica a 20 km de Belo Horizonte, adentrando no sertão mineiro, seguindo em sentido poente, do Leste para o oeste, passando pelo Centro Oeste de Minas, Alto Paranaíba, Triângulo Mineiro até o Noroeste de Minas, entrando em solo goiano até Vila Boa de Goyáz, terra natal da poetisa e contista Cora Coralina.
          O trajeto original da Picada de Goiáz, de Sabará até Vila Boa de Goyáz, com aproximadamente 1300 km de extensão. São cidades mineiras e goianas ao longo de todo o percurso, num total de 79, unindo os caminhos velho e novo. (no mapa acima, o traçado original do Caminho Velho e Novo da Picada de Goyáz em Minas Gerais e Goiás)
          Depois da Estrada Real, a Picada de Goyáz era o mais importante caminho para escoamento de riquezas para a Colônia. Não ligava apenas o Sul e Sudeste a Goiás, mas também a Cuiabá e Amazônia.
          As riquezas extraídas do solo goiano, seguiam para Minas em cortejos formados por dezenas de carros de bois e mulas, até Sabará. A partir de Sabará, os cortejos seguiam pela Estrada Real até o porto de Paraty/RJ, onde uma parte das riquezas extraídas na Colônia eram encaminhadas à Corte e a maior parte, para Portugal.
          Nascia assim o Caminho Velho da Picada de Goyáz, a grafia do estado goiano na época. Por este caminho, povoados, vilas e cidades foram sendo formadas, desde o século XVIII. Em todo o trecho, casas isoladas, povoados em formação surgiam, bem como foi o início de nossa mineiridade, formada por gente com origens indígena, bandeirante, africana, tropeira, boiadeira, mercadores e viajantes estrangeiros. Esses diferentes tipos de povos, deram origem a um novo povo, nascido e formado nas picadas do Caminho Velho da Picada de Goyáz e também na Estrada Real.
Bom Despacho MG
          Foi em torno desse caminho e presença desses povos, que surgiu uma povoação no final do século XVIII, que mais tarde deu origem ao município de Bom Despacho MG, a 150 km de Belo Horizonte, hoje com 55 mil habitantes.
          Bom Despacho teve grande importância na formação do Caminho do Sertão, como era chamada a Picada de Goyáz. Isso porque a cidade tem o Rio São Francisco como seu divisor. (panorâmica de Bom Despacho na foto acima de Arnaldo Silva)
          A rota da Picada chega à Bom Despacho pela estrada de Leandro Ferreira, que termina nas proximidades do antigo Caic, no bairro Ana Rosa, seguindo pela Avenida Dr. Roberto, pegando a Avenida Doutor Juca, seguindo pela estrada da Garça, até a Fazenda da Piraquara. (na imagem acima, desenhada pelo Eduardo Valente, o trajeto da Picada de Goiás no perímetro urbano de Bom Despacho MG)
          Da Piraquara descia até o Engenho do Ribeiro, distrito de Bom Despacho, até o Rio São Francisco, onde foi construída uma ponte, lingado a Picada à Dores do Indaiá. (na imagem acima, de Arnaldo Silva, a estrada da Garça em Bom Despacho MG e abaixo a ponte de concreto sobre o Rio São Francisco, que substituiu a original, de madeira, ligando Bom Despacho a Dores do Indaiá)
          
Essa parte da Picada de Goyáz, de Bom Despacho a ponte do Rio São Francisco, entre Dores do Indaiá MG, era chamado de Caminho da Piraquara. A Fazenda da Piraquara seria de ponto de pouso, onde as tropas paravam, descansavam, se alimentavam, se banhavam, pernoitavam e ainda, levavam alimentos para seguirem a viagem, até a próxima parada.
          O caminho da Piraquara era um dos pontos de parada mais importantes da Picada de Goyáz, além de ter água em abundância e terras férteis, o que atraiu moradores para a região, dando origem a formação de um povoado, vila, distrito e por fim, à cidade de Bom Despacho MG.
          A partir de Dores do Indaiá (na foto acima de Sueli Santos), a Picada de Goyáz seguia para a Serra da Saudade, Alto Paranaíba e Noroeste de Minas, quando a partir de Paracatu MG, entrava em solo goiano.
Caminho tropeiro e boiadeiro
          Com o fim do Ciclo do Ouro, a Picada de Goyáz continuou sendo usada para transportar riquezas, mas dessa vez para escoamento da produção agrícola de Minas Gerais e das regiões Norte e Centro Oeste do Brasil.
          Todos os dias, mulas, cavalos e carros de bois, cortavam o sertão mineiro e goiano, buscando e trazendo alimentos, mercadorias essenciais para a época como querosene, sal, açúcar, roupas, sapatos, etc., além de gado e porcos. (na foto acima de Arnaldo Silva, a Picada de Goyáz na Garça em Bom Despacho MG)
          Para ampliar o comércio e facilitar a distribuição das mercadorias, foi criado o Caminho Novo da Picada de Goyáz. O novo caminho iniciava em São João Del Rei MG passava por Oliveira, Itapecerica e Formiga, entrando na Serra da Canastra seguindo até o Desemborque, distrito de Sacramento, no Triângulo Mineiro que é a liga dos três caminhos da Picada de Goyáz. Do Desemboque, o Caminho Novo segue até Vila Boa de Goyáz. O Caminho Novo é formado por 39 cidades com aproximadamente, 700 km de extensão.
O caminho que virou trilho
          No final do século XIX, começa a implantação de ferrovias no Brasil e no início do século XIX, os automóveis começam a se popularizar, bem como ônibus e caminhões. Com isso, o transporte de cargas e alimentos feito com o uso de animais, começa a declinar e os velhos caminhos abertos no século XVIII, a serem esquecidos, alguns trechos transformados em estradas vicinais e boa parte, para passagem de trilhos.
          Aberto pelos índios, usado e ampliado por bandeirantes, de grande utilidade para tropeiros, parte desses caminhos abertos no século XVIII e XIX, foram utilizados na implantação de ferrovias, como por para colocação de trilhos da Estrada de Ferro Paracatu que ligava Belo Horizonte e o Centro Oeste Mineiro até Paracatu, no Noroeste do Estado, na divisa com Goiás. (na imagem acima de Arnaldo Silva, a Picada de Goyáz entre Bom Despacho e Leandro Ferreira MG, passou a ser caminho do trem da Estrada de Ferro Paracatu)
          Com o fim deste ramal ferroviário, o caminho da Picada de Goyáz em Minas acabou sendo esquecido, ficando apenas na história.
A reconstrução da Picada de Goyáz
          A partir de 2017, o Caminho Velho e Novo do Sertão da Picada de Goiás, sai do esquecimento para se transformar num projeto de reativação e recuperação. O objetivo é recuperar parte da história de Minas e incrementar o turismo nas cidades surgidas durante a existência da Picada de Goyáz.
          O projeto prevê ainda a demarcação com tótens de ACM para as áreas urbanas, de concreto para as áreas rurais e urbanas e de eucaliptos, para as encruzilhadas da zona rural. Esses tótens seguirão o estilo dos tótens da Estrada Real, contando ainda com o mapa de todo o percurso do Caminho da Picada de Goiáz.
          Quem está à frente do projeto é Eduardo Valente (na foto acima/ Arquivo Pessoal), morador da cidade de Dores do Indaiá, no Centro Oeste de Minas Gerais. Foi feito um mapeamento do Caminho Velho e Novo da Picada de Goyáz, com Valente percorrendo os cerca de 2 mil km dos dois caminhos, registrando as cidades, as picadas, as belezas naturais e turísticas às margens da Picada de Goyáz. Todo o trajeto foi catalogado em fotos, feitas pelo fotógrafo Marcelo Bastos, primordial para o registro visual com imagens de excelente qualidade de todo o trajeto. 
          Eduardo Valente é formado em Gestão em Comunicação Organizacional Relações Públicas – UNA- BH – MG, fez Extensão em Politicas Publicas do Turismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e Extensão em Politicas Publicas da Cultura – Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
          Além disso, foi Secretário de Lazer, Cultura e Turismo em Dores do Indaiá (2008 a 2017) Fundador, presidente, gestor e articulador do Circuito Turístico Caminhos do Indaiá, foi também Gestor e articulador do projeto Minas – Goiás e ainda ex-presidente do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico e Cultural de Dores do Indaiá e ex-presidente do Conselho Municipal de Turismo de Dores do Indaiá.
          Empenhado na reestruturação do Caminho Velho e Novo da Picada de Goyáz, Eduardo Valente concedeu entrevista sobre as atividades feitas até o momento e de como está todo o trabalho, visando a recuperação da Picada de Goyáz, que visa transformar o Caminho Velho e o Novo, em atrativo turístico das cidades que fazem parte da Picada de Goyáz.
Entrevista com Eduardo Valente
Conheça Minas: Quando foi criado o Caminho Picada de Goiáz? Conte um pouco sobrea história desse importante caminho surgido no século XVIII.
Eduardo Valente: As
 “Picadas de Goyáz” designam os caminhos antigos dos povos originários, batidos pelos Bandeirantes em direção a Goyáz, e ao poente, seguindo as lendas Tupi do Peabirú... Esses velhos caminhos e trilhas de entradas no Sertão dos Goyáz, bem como os locais de aprazíveis paragens deram origem às lindas cidades de arquitetura “Colonial” e “Barroca” espalhadas pelo interior de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso.
          A gestão dos caminhos no Império foi estratégica. Explodiu a brasilidade. Os caminhos se firmam no Século XVIII, administrados como “estradas reais” ligando as importantes vilas do Sul e Sudeste com Goyáz, Cuiabá e Amazônia.
          A picada aberta de Sabará até a Vila Boa de Goyáz é muito antiga. Parte de Sabará, atravessa o Rio São Francisco, passa na Fazenda da Piraquara, sobe pela Serra da Saudade e vai até Paracatu. De Paracatu segue até Vila Boa do Goyáz e Goyáz, terrinha amada de Cora. Essa Picada de Sabará ficou conhecida como “Caminho Velho de Goyáz” ou Caminho da Piraquara.
          No final do século XVIII firmou-se o Caminho Novo pra Goyáz, que partia de São João Del Rey e chegava em Vila Boa de Goyáz, passando por Oliveira, Itapecerica e Formiga, transpunha a belíssima e pavorosa Serra da Canastra e chegava em Araxá e Uberaba, sendo caminho muito batido no século XVIII, que ajudou a povoar o Centro-Oeste.
          Ao longo dessas Picadas para Goyáz surgiram paragens amenas, vilas e arraiais, cidades e distritos muito bonitos e aconchegantes, que oferecem raros atrativos turísticos, povoam lendas, casos e histórias, dispondo de recursos e paisagens naturais e culturais de extrema importância mundial à disposição de investidores e visitantes. (na imagem acima de Marcelo Bastos, Argirita, distrito de Ibiá MG)
          A “Picada de Goyáz” nasce nas terras de Mata Atlântica e Cerrado, pelos trilhos dos povos originários, pelas casas e currais de gentes que a habitam desde tempos imemoriais. Descendem de índio, bandeirantes, tropeiros, boiadeiros, mercadores e viajantes estrangeiros, que precisam participar efetivamente de um progresso sustentável!
Conheça Minas: Qual a origem do nome Picada de Goyáz
Eduardo Valente: Foi denominada Picada de Goyáz pelo motivo de levar às minas de ouro dos Goyazes, povos originários da região. Em todos os estudos de pesquisa, o caminho é denominado Picada de Goyaz pelos escritores e historiadores.
Conheça Minas: Porque a Picada de Goyáz é também chamada de Caminho Real do Sertão?
Eduardo Valente: Pelo motivo de ser caminhos oficiais da Coroa Portuguesa e passar pelo sertão das Minas Gerais, em sua vegetação predominante que é o Cerrado.
Conheça Minas: Com o declínio do ouro, foi aberto outro caminho até Goyáz, conhecido como Caminho Novo da Picada de Goyáz. O Caminho Velho e o Caminho Novo da Picada de Goyáz tinha início em quais cidades mineiras?
Eduardo Valente: O caminho se deu início no litoral brasileiro onde chegavam as embarcações dos colonizadores. Os bandeirantes seguiam uma rota já provavelmente existentes feitas pelos povos originários. Seu sentido é leste oeste, sol nascente para quem seguia a oeste e poente para quem retornava rumo as cidades litorâneas, trazendo mercadorias que seriam enviadas aos países da Europa. Como os navegadores para se referenciarem e não se perderem usavam o sol como direção. Com a rota já denominada pelo Instituto Estrada Real até as Minas, tivemos como ponto de partida Sabará no caminho velho e São João Del Rey no Caminho Novo como ponto de partida na entrada das Gerais.
Conheça Minas: Do início ao fim são quantos km?
Eduardo Valente: Temos dois caminhos. Caminho Velho e Caminho Novo. O Velho tem aproximadamente 1300 quilômetros e o Novo por volta de 700 quilômetros.
Conheça Minas: Qual a finalidade desse caminho que ligava Minas Gerais à Goiás Velho?
Eduardo Valente: Caminho mais curto e reto rumo ao litoral para escoamento de pedras preciosas e mercadorias que eram trazidas por exploradores, garimpeiros e comerciantes.
Conheça Minas: Sabe descrever quais foram os personagens ilustres de nossa história que passaram pelo Caminho Real do Sertão?
Eduardo Valente: Todos que você possa imaginar. Borba Gato, Tiradentes, Botânico August Saint Hilaire, Anhanguera e muito mais.
Conheça Minas: Antes da chegada dos europeus e bandeirantes nosso território era habitado por diferentes etnias indígenas, que se comunicavam entre si abrindo caminhos no sertão. Os bandeirantes que buscavam ouro, aproveitaram que o caminho que já existia e passaram a usá-lo?
Eduardo Valente: Já existam aglomerações de povos originários por todo o continente muito antes da chegada dos europeus. As civilizações indígenas eram nômades e percorriam a região a procura de alimentos (caça) e locais seguros para morada. Existem relatos históricos que os caminhos (trilhas ou picadas) foram aproveitados pelos europeus sendo os caminhos do Peabirú.
Conheça Minas: O traçado da Estrada de Ferro Paracatu aproveitou do Caminho Picada de Goyáz? O antigo caminho virou estrada de ferro?
Eduardo Valente: Grande parte da Picada sendo o caminho velho ou novo são margeadas pelas ferrovias. O grande exemplo do caminho velho (nosso caminho) é que de Pitangui a Barra do Funchal, localizada no município da Serra da Saudade, existem estações e estruturas ferroviárias que tinham como objetivo chegar a Paracatu.
Conheça Minas: Por quanto tempo a Picada de Goyáz foi usada como caminho por bandeirantes e tropeiros?
Eduardo Valente: Estes caminhos antigos eram usados frequentemente até a criação do automóvel movido a combustão. Com isso novas rotas com mais infraestrutura foram criadas como por exemplo a BR-262 que mudaram o fluxo de pessoas, fazendo com que as antigas rotas que não foram estruturadas, ficando a ser apenas estradas vicinais.
Conheça Minas: Você vem se empenhando para resgatar o caminho da Picada de Goyáz em sua originalidade. O que foi feito até agora?
Eduardo Valente: Existe todo um processo para que uma rota histórica vire um produto turístico, seguindo as orientações do Ministério do Turismo. A primeira fase e o mapeamento da rota que vem sendo trabalhada desde 2017. Nesta segunda fase estamos dando início a roteirização, para que podemos saber onde hospedar, alimentar, abastecer e reconhecimento dos atrativos culturais e naturais, gastronomia entre outros possam ser visitados pelos turistas. (na imagem acima de Marcelo Bastos, carro da equipe da Picada de Goyáz no Desemboque MG)
Conheça Minas: Pretendem catalogar os pontos turísticos, a gastronomia, cultura e folclore das cidades que fazem parte da Picada de Goyáz?
Eduardo Valente: Esta etapa é realizada na roteirização.
Conheça Minas: Como que está sendo feito o resgate do Caminho Real do Sertão? Vocês têm apoio de prefeituras, órgãos do Governo, empresários?
Eduardo Valente: Possuímos apoio institucional dos estados de MG e GO, assim como apoio financeiro de prefeituras e iniciativa privada. Temos apoio também de Instancias de Governanças regionais que fazem parte das políticas de regionalização do estado, onde as mesmas representam municípios localizados na rota da Picada. (na imagem acima de Marcelo Bastos, fazenda histórica as margens da Picada de Goyáz)
Conheça Minas: Como as prefeituras estão reagindo ao projeto?
Eduardo Valente: Os apoios das prefeituras estão sendo fundamentais para o desenvolvimento da Picada. Tivemos e estamos tendo grande apoio da prefeitura de Dores do Indaiá, Itapecerica, Formiga e Oliveira.
Conheça Minas: Pretendem demarcar a Picada de Goyáz com tótens, como foi feito do Caminho Velho e Novo da Estrada Real?
Eduardo Valente: Estamos na fase de criação do projeto piloto de sinalização. Estamos elaborando três tipos de totens sendo eles o de concreto para as zonas urbanas e rural, o de ACM para colocar na zona urbana e o de eucalipto para demarcar as encruzilhadas da zona rural. Os totens de concretos serão instalados em atrativos e comunidades importantes do trajeto. O de ACM em atrativos urbanos onde terá em sua composição o mapa e localização do percurso.
Conheça Minas: Após a demarcação e de catalogar os pontos turísticos, a gastronomia, folclore e cultura das cidades que fazem parte do Caminho Picada de Goyáz, o que será feito em seguida?
Eduardo Valente: A partir daí teremos produtos turísticos referenciados pela picada. Poderão ser criados rotas curtas ou longas onde os receptivos locais e comunidade poderão conduzir os turistas de acordo com a disponibilidade do turista.
Conheça Minas: Pretendem organizar cavalgadas, passeios ciclísticos, ralis do Caminho Real do Sertão e festividades no trajeto do Caminho Velho e Novo?
Eduardo Valente: Pretendemos realizar sim eventos desses tipos assim como eventos de conhecimento como seminários e encontros de historiadores.
Conheça Minas: O nome original do Caminho é Picada de Goiáz. A grafia portuguesa sofreu modificações ao longo do século passado, como exemplo, palavras no português antigo com final em Z, teve essa letra alterada para s. Então, Goyáz é hoje, na atual grafia portuguesa, Goiás. Pretendem manter o nome original do Caminho Picada de Goyáz ou mudarão para Picada de Goiás?
Eduardo Valente: Pretendemos sim manter a grafia antiga, até para que remeta aos tempos antigos.
Conheça Minas: Quais cidades do Estado de Goiás fazem parte do Caminho Velho Picada de Goyáz?
Eduardo Valente: Cristalina, São Bartolomeu, Luziânia, Alexânia, Abadiânia. A partir daí entramos na rota denominada como Caminho de Cora Coralina pelos goianos, passando por Corumbá de Goiás, Cocalzinho de Goiás, Pirenópolis, Caxambu (distrito de Pirenópolis), Radiolândia, São Francisco de Goiás, Jaraguá, Itaguari, Cidade de Goiás. Para o caminho novo fazer conexão com o velho passamos por Catalão no estado de Goiás. 
          Para os goianos o trecho da Picada denominado como Caminho de Cora Coralina foi assim chamado por motivos de marketing de produto para ficar mais comercial, espalhando poesias de cora por todo o percurso. Pela lógica, quem existiu primeiro? Cora ou a picada? Claro que a picada ao qual Cora percorria por algum motivo. Vemos isso como vantagem para os viajantes da picada pelo motivo do trecho já estar estruturado para os turistas.
Conheça Minas: Quantas são e quais as cidades de Minas e Goiás que fazem parte do Caminho Novo da Picada de Goyáz?
Eduardo Valente: O Caminho Novo é formado por 39 municípios. A primeira cidade é São João Del Rei MG (na foto acima de César Reis), com o caminho seguindo para Ritápolis, São Tiago,  Morro do Ferro, distrito de Oliveira, Oliveira, Carmo da Marta, Lamounier (distrito de Itapecerica), Itapecerica, Formiga.
          Neste ponto ao caminho se divide em três caminhos: Caminho de Bambui, Transcanastra e Caminho de Saint Hilaire.
O Caminho de Saint Hilaire tem início em Córrego Fundo, Pimenta, Santo Hilário (distrito de Pimenta), Piumhi, Capitólio, São João Batista do Glória, Babilônia (distrito de Delfinópolis), Delfinópolis, Desemboque (distrito de Sacramento MG), o ponto final dos três caminhos
          O Caminho de Bambuí começa em Formiga, segue para Arcos, Iguatama, Bambuí, Medeiros, Pratinha, Argenita (distrito de Ibiá), Araxá, Tapira, chega em Desemboque, distrito de Sacramento MG.
          O Caminho TransCanastra tem também início em Formiga, passando também por Córrego Fundo, seguindo para Pains, Doresópolis, São Roque de Minas, Sacramento, chegando em Desemboque.
          Os três caminhos se encontram em Desemboque e tem sua continuação em um único caminho até Guarda Mór MG, seguindo para Conquista, Peirópolis (distrito de Uberaba), Uberaba, Tapuirama (distrito de Uberlândia), Indianópolis, Araguari, entrando em Goiás por Catalão GO, Pires Belo (distrito de Catalão GO), Santo Antônio do Rio Verde (distrito de Catalão GO). (na imagem acima de Marcelo Bastos, travessia de balsa em Indianópolis MG, na divisa com Goiás e abaixo, a cidade de Catalão/GO)
          Guarda Mor em Minas faz a ligação Caminho Novo com o Caminho Velho
Conheça Minas: Quais as cidades mineiras que fazem parte do Caminho Velho da Picada de Goyáz?
Eduardo Valente: O Caminho Velho é formado por 40 municípios. Começa em Sabará MG (na foto acima de Arnaldo Silva), segue para Belo Horizonte, passando por Contagem, Betim, Juatuba, Mateus Leme, Florestal, Pará de Minas, Conceição do Pará, Onça do Pitangui, Pitangui, Leandro Ferreira, Bom Despacho, Dores do Indaiá, Serra da Saudade, São Gotardo, Guarda dos Ferreiros, Rio Paranaíba, Carmo do Paranaíba, Lagoa Formosa, Pilar, Lagamar, Vazante, Guarda Mor (liga com o caminho novo).
          De Guarda Mor, cidade mineira que liga o Caminho Novo com o Velho, segue para Paracatu, a última cidade mineira da Picada de Goyáz. Entra em território goiano por Cristalina, seguindo para Luziânia, Alexânia, Abadiânia, Corumbá de Goiás, Cocalzinho de Goiás, Pirenópolis, Radiolândia, São Francisco de Goiás, Jaraguá, Itaguari, Itaberaí e por fim, Cidade de Goiás, encerrando a o Caminho Velho do Sertão. 

sábado, 26 de fevereiro de 2022

Os 10 destinos mais acolhedores do Brasil em 2024

(Por Arnaldo Silva) A cidade de Carrancas, no Campo das Vertentes e Gonçalves, no Sul de Minas, foram eleitas entre os 10 destinos mais acolhedores do Brasil, em 2024, na tradição eleição anual, promovida pela plataforma Booking.com (na imagem acima do Marcelo Santos, a Matriz de Carrancas e abaixo de Fernando Campanella, a cidade de Gonçalves)
O que é a Booking?
             Disponível em cerca de 43 idiomas e atualmente a maior plataforma de viagens do mundo, a Booking.com oferece a seus mais de 309 milhões de afiliados, serviços de reservas pela internet de acomodações para férias e viagens.
          Um dos destaques da plataforma é a eleição dos lugares mais acolhedores de cada país, já na 12° edição, de 2024. A eleição é feita com base em avaliações de seus usuários, nesse caso, do Brasil. Trata-se de uma avaliação das experiências de viagens dos usuários da plataforma, de forma real e enviadas no momento da viagem. São avaliações feitas em tempo real pelos viajantes que usaram os serviços da plataforma.
Como é feita a pesquisa?
          A pesquisa foi feita com os usuários da plataforma no Brasil, de forma online, no final de 2023 e início de 2024, com resultado divulgado em abril. A plataforma colheu informações e avaliações de seus usuários sobre os serviços de alugueis de carro, serviços de transportes públicos e privados e principalmente, estrutura das hospedagens e opinião dos seus afiliados sobre o acolhimento recebido. Cada destino a ser votado tinha que ter pelo menos 50 acomodações elegíveis para serem incluídas na lista. 
          A avaliação de cada item vai até 10, sendo que para ser premiado, a média tem que ser igual ou superior a 8 ao menos entre 3 a 5 quesitos avaliados. Como resultado final, a plataforma elege de acordo com as avaliações dos seus usuários, os 10 destinos mais acolhedores do Brasil.
          Cidades mineiras sempre aparecem na listas dos 10 destinos mais acolhedores do Brasil. Nessa 12° edição, duas cidades mineiras figuram na lista: Carrancas, na terceira colocação e Gonçalves, no Sul de Minas, na quinta posição. (na foto acima do Fernando Campanella, paisagem de Gonçalves e abaixo, do Rogério Salgado, a Serra de Carrancas) 
          Duas cidades com tradições históricas, tradicionais, com uma rica gastronomia típica, artesanato, cultura popular, com boas estruturas para receberem turistas, além de serem cidades com alto potencial para o turismo ecológico. 
          Ambas as cidades, são acolhedoras e seus moradores, hospitaleiros, gentis, atenciosos, fazendo jus a fama dos mineiros em receberem muito bem suas visitas. (nas fotos abaixo de Elpídio Justino de Andrade, Gonçalves e Carrancas)


Os 10 destinos mais acolhedores do Brasil em 2024
. São Bento do Sapucaí, São Paulo
2°. Pedra Azul, Espírito Santo
3°. Carrancas, Minas Gerais
4°. Visconde de Mauá, Rio de Janeiro
5°. Gonçalves, Minas Gerais
6°. Flecheiras, Ceará
7°. Maraú, Bahia
8°. Pomerode, Santa Catarina
9°. Cunha, São Paulo
10. Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul
Fonte: Booking.com

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Primeira Estrada: o pioneiro vinho fino de Caldas

(Por Arnaldo Silva) No coração do Sul de Minas, a 1300 metros de altitude, entre as montanhas da Mantiqueira, está a cidade de Caldas. Com origens no século XVIII, foi elevada a distrito em 16 de março de 1839, no século XIX, data em que em que se comemora sua fundação.
          Fazendo divisa com Andradas, Poços de Caldas, Ibitiúra de Minas, Santa Rita de Caldas, Campestre e Bandeira do Sul, Caldas está a 434 km distante de Belo Horizonte, 260 k da capital de São Paulo e conta com cerca de 15 mil habitantes.
          O município se destaca por suas tradições seculares, como por exemplo, a culinária, seu rico artesanato, tradições religiosas e pelo ecoturismo, graças as suas belezas naturais como rios, cachoeiras, nascentes, picos e matas nativas de Mata Atlântica.
          Além disso, Caldas é uma estância hidromineral e climática, com destaque para o distrito de Pocinhos do Rio Verde, onde se concentra águas medicinais, minerais e sulfurosas com propriedades curativas em seu principal balneário.
          Todos os anos, Caldas realiza a Festa da Uva e a Festa do Biscoito, em todo o mês de julho, já que a cidade é um dos destaques em Minas na produção de doces e principalmente quitandas, em especial, biscoitos. (na imagem acima, colheita de uvas na Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          Além disso, Caldas é um dos maiores produtores de cenoura, mandioquinha, tomate, batata-inglesa e o segundo maior produtor de uvas de Minas Gerais.
          Em Caldas está sediada o Núcleo Tecnológico Epamig Uva e Vinho. Da Epamig de Caldas, são desenvolvidas técnicas para plantio de vinhas, além de pesquisas que favorecem a melhora da qualidade dos vinhos e desenvolvimento das vinícolas, não só da região da Mantiqueira, mas de todo o Estado de Minas Gerais.
          A cidade tem tradição na produção de vinhos finos, de alta qualidade e competitividade, que saem das adegas das várias vinícolas caldense, como a Vinícola Estrada Real, que produz vinhos com o rótulo Primeira Estrada. (na foto acima vinhos Primeira Estrada da Vinícola Estrada Real/Divulgação)
Fundador
          Fundada por Murillo de Albuquerque Regina, ex pesquisador e Coordenador do Programa Estadual de Pesquisa em Vitivinicultura da Epamig da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG). Murilo de Albuquerque foi o criador da técnica da dupla poda, quando era funcionário da estatal mineira.
          Na vinícola Estrada Real, Murilo Regina tem ainda como sócios Marcos Arruda, Patrick Arsicaud e Thibaud Salettes.
          Como seu fundador foi o criador da técnica da dupla poda, a vinícola Estrada Real foi a pioneira ao aplicar essa técnica.
A vinícola e a origem do nome
          Contando com uma estrutura industrial moderna e sempre em atualização com as novas tecnologias e tendências mundiais na produção de vinhos finos de alta qualidade, a Vinícola Estrada Real, está instalada na cidade de Caldas, com o rótulo Primeira Estrada. Conta ainda com um eficiente e qualificado corpo de colaboradores, desde a poda, colheita, passando pela parte industrial, bem como enólogo e profissionais altamente qualificados. (foto acima Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          A região Sul de Minas, faz parte do Caminho Velho da Estrada Real, por isso o nome escolhido, já que Caldas, está no Sul de Minas. (na imagem acima, vinhedos de uva Syrah em Três Corações, no sul de Minas, da Vinícola Estrada Real em Caldas MG/Divulgação)
          Os rótulos dos vinhos da Vinícola Estrada Real, tem o nome Primeira Estrada devido seu fundador ter sido o criador da técnica da dupla poda e sua vinícola, Estrada Real, ter sido a pioneira a aplicar essa técnica. Com isso, abriu-se a estrada para que outros produtores, produzem vinhos finos de qualidade, com essa técnica. Foi a primeira estrada aberta, por isso o nome do rótulo, Primeira Estrada. (na foto acima, vinho fino branco seco Primeira Estrada da Vinícola Estrada Real/Divulgação)
A dupla poda
          Tradicionalmente, a poda nos vinhedos é feita uma vez por ano, na primavera, com a colheita das uvas feitas no verão, em janeiro. Por ser uma época de calor e sol forte, além de chuvas intensas, a proliferação de pragas e perda da qualidade das uvas é constante. Para evitar esses efeitos, o produtor investe alto no controle das videiras, o que acarreta aumento dos custos de produção e do produto final, consequentemente.
          A dupla poda surgiu para evitar esses problemas. Trata-se da inversão do ciclo produtivo da fruta, fazendo a poda no início do inverno e não na primavera, como de costume. Com a poda feita na primavera, a colheita já pode ser feita em agosto. (na imagem acima parreirais de uva Syrah em Três Corações/Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          Em Minas Gerais, as uvas da colheita de inverno, são usadas na produção de vinhos finos. Graças a essa técnica inovadora e pioneira em Minas Gerais, as uvas são mais sadias, com mais concentração de cor, aroma e sabor, além de propiciar uma excelente maturação.
          Com os vinhedos produzindo uvas no inverno, faz-se novamente a poda tradicional, na primavera, garantindo assim nova colheita no verão, em janeiro.
          O resultado final foi um significativo aumento da qualidade dos vinhos mineiros, tornando-os competitivos no cenário nacional e mundial. Prova disso são os inúmeros prêmios, em concursos mundiais de vinhos finos, conquistados pelos mineiros e vinícolas que utilizam a técnica da dupla poda em Minas Gerais e na Serra da Mantiqueira.
Primeira Estrada 
           Entre os rótulos premiados, graças ao desenvolvimento e melhora da qualidade dos vinhos mineiros, feitos com a técnica da dupla poda, está a o rótulo Primeira Estrada Syrah Gran Reserva 2018 da Vinícola Estrada Real. (na foto acima/Divulgação)
          O Primeira Estrada recebeu, em 2020, o prêmio de melhor syrah brasileiro durante o evento da Wines of Brazil Awards. Além desse prêmio, outros rótulos Primeira Estrada, receberam diversas outras premiações nacionais por seus vinhos de qualidade.
Uvas viníferas
          Nos parreirais da vinícola Estrada Real em Três Corações MG são colhidas uvas Syrah (sirrá) e Sauvignon Blanc (sôvinhom blam). Já em Caldas MG, são colhidas uvas Chardonnay (chardoné), cultivadas no sistema normal de colheita de verão. (foto acima uva Syrah e abaixo, Chardonay/Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          As primeiras mudas de Syrah foram plantadas em 2001, com o primeiro vinho elaborado em 2003.
O processo de produção dos vinhos Estrada Real
           Produzir vinho fino é bem longo. Inicia-se com a colheita manual das uvas que são colocadas em caixas de 13 kg, cada.
          As caixas são levadas para a vinícola, onde as uvas são desengaçadas e encubadas em tanques de aço inoxidável por 4 dias a 8ºC, iniciando assim a fase pré-fermentativa. (na foto abaixo/Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          Após os quatros dias, começa o processo 8 dias de fermentação alcoólica a 24ºC feito com leveduras selecionadas, ficando o vinho, por mais 12 dias em contato com a casca das uvas. A fermentação ocorre naturalmente, respeitando o tempo descrito acima, sem nenhum tipo de aditivos químicos.
          Após todo esse processo é que são separados o sólido e o liquido para obtenção do vinho, que segue para os barris, onde permanecerão “descansando” por 10 meses. (foto acima e abaixo de Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          Após esse tempo, o vinho é filtrado e engarrafado, permanecendo em caves (cômodo abaixo do subsolo) por mais 8 meses, em temperatura controlada.
Estação enológica e mudas
           Em 2003, é criada, pela Vinícola Estrada Real, a Vitácea Brasil para produção e comercialização de mudas de uvas de mesa, uva para suco, vinho comum e vinho fino. São mudas com alta pureza genética e sanitária.
          A empresa atende todas as regiões brasileiras. É hoje líder nacional no segmento de viveiros vitícolas, além de possuir licença para fazer multiplicação e clonagens de obtentores e selecionadores mundiais como Grappa (USA), SNFL (Espanha), ENTAV (França), Sun World (USA) e Embrapa (Brasil)
          Além disso, a Vinícola Estrada Real tem parceria com a vinícola Maria Maria de Três Corações, na Estação Vitácea Enológica. (foto acima Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          Vitácea é a ciência que estuda o desenvolvimento de produção de vinhos finos, além de estudos sobre tecnologias de conservação. Uma estação enológica é um local onde são elaborados espumantes e vinhos finos tintos, brancos e rosés.
          A Estação Vitácea Enológica das Vinícolas Maria Maria e Estrada Real, prestam ainda serviços de vinificação e análises físico-químicas de vinhos para terceiros.
Primeira Estrada: primeiro vinho fino feito a partir da técnica dupla poda
          Em cada taça dos vinhos Primeira Estrada, da Vinícola Estrada Real, seja espumante, vinhos brancos, tintos frutados ou complexos, sente-se o expressivo e o predominante sabor da fruta. São vinhos finos, produzidos com tecnologia de ponta, ao mesmo tempo, com sabor, textura e qualidade dos melhores vinhos mundiais e ainda sem nenhuma adição de químicos. (foto acima Vinícola Estrada Real/Divulgação)
          São vinhos tintos frutados e tintos complexos, com passagem em barrica, bem como vinhos brancos e espumantes, igualmente, de qualidade.
(mais informações podem ser obtidas com Pedro Olavo pelo telefone 35-99932-3376)

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

O Clube, a Esquina e a musicalidade mineira

(Por Arnaldo Silva) Saindo da cidade de Três Pontas, no Sul de Minas, Milton Nascimento chega em Belo Horizonte em 1963. Na capital, Bituca, como era carinhosamente chamado, foi morar no quinto andar Edifício Levy. Neste mesmo edifício, morava a família Borges.
          Nessa época, Lô Borges tinha apenas 10 anos. Quando desceu para comprar pão, ouviu Milton Nascimento cantar. Se interessou logo em conhecer o cantor. Surgiu assim uma amizade e admiração, com Milton Nascimento conhecendo os irmãos de Lô Borges, Milton e Márcio Borges. Pouco tempo depois, se juntava ao grupo Wagner Tiso.
          O pequeno grupo de amigos começou a se encontrar frequentemente, numa esquina da Rua Divinópolis com Paraisópolis, no bairro Santa Tereza (na foto acima do Thelmo Lins). Nesta esquina, conversavam, tocavam e cantavam as canções que cada um compunha.
          Ao pequeno grupo, foram se unindo outros músicos, cantores e compositores mineiros como Fernando Brant, Nivaldo Ornelas, Paulo Braga, Beto Guedes, Flávio Venturini, Tavinho Moura, Nelson Ângelo, Tavito, Robertinho Silva, Luiz Alves, Vermelho, Rubinho, Toninho Horta, dentre outros. (na foto acima de Thelmo Lins, placa em frente à famosa esquina do Santa Tereza)
Gêneros musicais
          Músicos de talentos inigualáveis, os membros do Clube da Esquina representavam o que tinha de mais genuíno e autêntico na música mineira. A sonoridade específica das músicas, os arranjos e letras das composições, são únicos e inconfundíveis.
          Isso se deve à fusão diferentes gêneros musicais, que cada integrante do Clube da Esquina trouxe consigo, ao se juntarem ao grupo, como a Música Regional, MPB, Bossa Nova, Música Experimental, Rock Progressivo e Psicodélico, Smooth Jazz, Jazz Rock, Jazz Fusion, Art Rock, Samba, Música Folclórica mineira, Música Erudita e Mod.
          Essa fusão de sons e gêneros diferentes de cada um dos artistas que formavam o Clube da Esquina, gerou um dos mais impactantes, importantes e impressionantes movimentos musicais do século XX.
          Além disso, o movimento influenciou toda uma geração, tornou popular a música mineira no Brasil, além de ser ter sido um movimento de forte influência musical em nível nacional e mundial.
          No ecletismo dos gêneros musicais predominavam o violão, instrumentos de percussão, bateria, teclados, baixo elétrico, contrabaixo e guitarra elétrica. Com esses instrumentos, os integrantes do Clube da Esquina, mesclavam seus gêneros e entoando notas diferenciadas graças ao talento de seus integrantes, na união de sons e arranjos fantásticos.
O que é o Clube da Esquina?
          O Clube da Esquina não é um clube na expressão literal da palavra e nem seus integrantes formavam uma banda ou grupo musical. Era um grupo de amigos que tinham em comum a música. O grupo se formou de forma espontânea, se encontrando com frequência em uma esquina do bairro Santa Tereza, para trocarem experiências musicais, conversarem entre si, apresentarem suas composições, canções, arranjos. Um grupo de amigos, que tinham em comum a música. (na foto acima e abaixo de Thelmo Lins, placas oficiais na esquina onde foi formado o Clube da Esquina)
          Cada um dos integrantes do Clube da Esquina tinha sua própria carreira musical. Em apresentações solos ou em bandas, cantavam e gravavam suas canções.

          Por serem integrantes do movimento musical e seguirem o gênero musical do grupo, as composições musicais desses integrantes, durante a existência do Clube da Esquina (1972/1978), integram o acervo do movimento musical, imortalizadas como músicas do Clube da Esquina.
          Com o nome Clube da Esquina, apenas dois álbuns foram lançados durante a existência do movimento: Clube da Esquina I (1972) de Milton Nascimento e Lô Borges e Clube da Esquina II (1978), de Milton Nascimento.
          O restante da discografia que faz parte da odisseia dos mineiros do Clube da Esquina, são lançamentos individuais, de cada artista do grupo, seguindo o gênero e sonoridade do movimento musical mineiro. Destaque para discos o e composições de Milton Nascimento, Beto Guedes, Lô Borges, Toninho Horta, dentre outros, além das composições de Fernando Brant, um dos principais compositores de músicas do Clube da Esquina, reconhecido como um dos maiores compositores brasileiros.
Por que Clube da Esquina
          A esquina onde o grupo se encontrava começou a se popularizar. Foi sugerido ao grupo frequentarem um clube da alta sociedade belo-horizontina da época, mas o grupo recusou. (na imagem acima de Thelmo Lins, placa fixada em frente à famosa esquina do Santa Tereza)
          A ideia de um clube foi atraente, mas todos entendiam que o lugar deles era ali, naquela esquina. Ali era o lugar deles. A esquina do Santa Tereza era o local de encontro e eles, os artistas, eram o próprio clube. Se era para estar num clube, a esquina era o clube.
          Assim ficou, Clube da Esquina que passou a ser muito além de um clube de encontro de amigos que tinham em comum, o gosto pela música, para ser um dos maiores estilos musicais do Brasil, considerado o maior movimento musical brasileiro, depois da Tropicália.
50 anos do Clube da Esquina
          Na década de 1970, o estilo musical do Clube da Esquina já se tornara conhecido e suas canções já influenciava gerações de artistas e amantes da boa música. A partir de 1972, o Clube da Esquina se desponta no Brasil como movimento musical.
          Embora tenha surgido a partir 1963, não como estilo e movimento musical, mas como um grupo de amigos que se encontravam na esquina do Santa Tereza, 1972 é o ano de referência da criação do Clube da Esquina. 1978 é o ano que o movimento musical encerrou sua epopeia. Em 2022, o movimento musical Clube da Esquina completa 50 anos. (na imagem acima de Thelmo Lins, placa em frente à famosa esquina do Santa Tereza)
          Durante os anos de existência do Clube da Esquina, canções, de grande valor para Minas Gerais, o Brasil e a humanidade, surgiram. Verdadeiras joias da música mineira e brasileira. São músicas eternizadas e que nunca saem de moda. Uma verdadeira epopeia musical, nascida numa época de ouro da música mineira e brasileira.
          Mesmo as canções, composições, discos e álbuns individuais dos integrantes do Clube da Esquina, compostas antes de 1972 e durante os anos do movimento, até 1978, são consideradas como sendo do movimento musical, por terem sonoridade e estilo das músicas do Clube da Esquina.
          Canções épicas do Clube da esquina e de integrantes do movimento musical, estão presentes até os dias de hoje em nosso cotidiano e fazem parte da cultura mineira e brasileira.
          Como por exemplo Ponta de Areia, Travessia, Maria, Maria, Canção da América, Planeta Blue, Promessas do Sol, O Vendedor de Sonhos, Encontros e Despedidas, San Vicente, Nos Bailes da Vida, Suíte Minas Gerais, Trem Azul, Para Lennon e MacCartney, Calixbento, Trem de doido, Paisagem da janela, Cravo e Canela, Estrelas, Nada será como antes, Tudo que você podia ser, dentre outras tantas canções, presentes em discos épicos como Travessia (1967) de Milton Nascimento Lô Borges (O disco do tênis - 1972), de Lô Borges, Amor de Índio (1978) de Beto Guedes, Som Imaginário (1970 e 1971), Matança do Porco (1973), dentre outros discos e álbuns lançados pelos integrantes do Clube da Esquina, entre 1963 e 1978.
O Bar do Museu
          Na esquina do local onde os integrantes do Clube da Esquina se encontravam, onde era antigamente o Bar do Godofredo, funciona desde dezembro de 2015, o Bar do Museu – Música, Poesia e Gastronomia. (fotografia acima de Thelmo Lins)
          Está a alguns metros da esquina onde os integrantes do Clube da Esquina costumavam se encontrar, no tradicional bairro de Santa Tereza, entre as Ruas Divinópolis e Paraisópolis.
          O ambiente interno conta toda a odisseia do Clube da Esquina. São objetos, discos de vinil e painéis que nos levam de volta aos velhos e saudosos tempos do Clube da Esquina, relatados poeticamente na música, Rua Ramalhete, do cantor e compositor Tavito.
          Além da decoração temática, o visitante encontra souvenires diversos, camisas e livros alusivos ao Clube da Esquina, pratos, quitutes, sobremesas e bebidas da nossa gastronomia, com nomes de músicas dos integrantes do Clube, além de poesia e apresentações musicais de canções Clube da Esquina. Fica aberto às quintas e sextas-feiras a partir das 16h e sábados, a partir das 12h até as 00:h. No outros dias da semana, não abre.
Patrimônio Cultural e Imaterial de Minas Gerais
          A música e sonoridade do Clube da Esquina, ainda não é oficialmente, Patrimônio Cultural e Imaterial de Minas Gerais, mas está caminhando para ser.
          Está em estudo e análise, desde janeiro de 2022, o projeto dedicado à Mineiridade, da Secretaria de Estado da Cultura e Turismo/Secult-MG. O objetivo final é reconhecer a obra musical do Clube da Esquina e de seus integrantes, como Patrimônio Cultural e Imaterial dos mineiros.

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Montanhês: o nome original do dialeto mineiro

(Por Arnaldo Silva) O português é a língua oficial do Brasil, mas cada estado brasileiro, de acordo com suas origens e formação, tem seu estilo, jeito e modo de falar peculiar. Isso se chama dialeto e sotaque.
Dialeto não é o mesmo que sotaque
          Embora pareçam ser sinônimos, dialeto é diferente de sotaque. Isso porque dialeto é definido como a forma de construção de palavras, frases próprias e completas de uma comunidade, povo ou região, de acordo com sua formação social, tradição, cultura, folclore e origens.
          Já o sotaque se define como a forma de pronunciar determinadas palavras usadas no nosso cotidiano de forma diferente do português tradicional. São pronuncias diferentes à fonética normal de determinadas palavras como por exemplo, o uso do X na pronúncia de várias palavras, muito expressivo entre os cariocas.
          No caso de Minas Gerais, o jeito calmo, tranquilo, atraente e encurtado de pronunciar as palavras e de construir frases inteiras, bem como o uso de palavras diferentes, até mesmo inexistentes no idioma oficial, não é sotaque, é dialeto.
Origem do dialeto mineiro
          O dialeto mineiro começou a ser formado no século XVIII, tendo sido consolidado no século XIX.
          No século XVIII, no auge do o Ciclo do Ouro, a população de Minas Gerais concentrava-se basicamente na Região Central da Capitania de Minas Gerais. Era a região onde concentrava-se as principais minas de ouro de Minas Gerais na época.
          Essa região correspondia hoje às cidades do Quadrilátero Ferrífero, Região Metropolitana de Belo Horizonte e 100 km de seu entorno, Centro Oeste Mineiro, bem como boa parte do Vale do Rio Doce.
          É uma região de alto relevo, altitudes elevadas e rodeadas por imensas montanhas. Por essas características, quem vivia nessa região era conhecido por montanhês e seu jeito próprio de falar, também.
          Durante o Ciclo do Ouro, quem nascia na Capitania de Minas Gerais era chamado de Geralista. O gentílico mineiro passou a ser usado e oficializado, tempos depois. O jeito típico do mineiro falar, já manifestado nessa época, passou a ser o Montanhês, o nome de origem do dialeto mineiro.
O dialeto Montanhês
          O jeito mineiro de falar é uma mistura de palavras africanas, portuguesas e indígenas. Esses povos formaram a base social, cultural, gastronômica, econômica, política e cultural de Minas Gerais.
          No século XIX, o dialeto Montanhês, ainda em formação, recebeu acréscimos de palavras introduzidas em Minas pelos ingleses. Os britânicos vieram para a província de Minas Gerais explorar as minas de ouro, em cidades da Região Central e Quadrilátero Ferrífero.
          Várias expressões presentes no dialeto mineiro, tem origem em palavras comuns da língua inglesa.
          São várias palavras, citando apenas como exemplos why (por quê), why so (porquê então?) e Where (onde).
          Quando ouviam essas palavras dos ingleses, os mineiros repetiam e escreviam da forma que entendiam. Sendo assim o why dos ingleses ficou, uai, o where, ué e o why so, uai sô. 
          Incorporadas ao dialeto Montanhês, não tem tradução específica, como as palavras originais do inglês. No dialeto Montanhês, passaram a ter vários significados, de acordo com a frase ou situação de momento.
          Com a expansão do crescimento de Minas Gerais para todas as regiões da província, o sotaque montanhês foi chegando a todas as regiões mineiras.
          A partir de meados do século XX, o nome Montanhês começou a entrar em esquecimento, devido o êxodo rural e por ser o nosso dialeto, confundido com o dialeto caipira e sertanejo.
Características fonéticas do dialeto Montanhês
          O dialeto do povo mineiro e seu jeito de falar é característico e identificável em qualquer lugar do Brasil, pelas expressões e a forma fonética com que o mineiro expressa seu dialeto.
          No dialeto Montanhês o ritmo da fala é rápido e bastante acentuado, devido várias expressões serem pronunciadas de forma aberta, em tons de exclamação, afirmação ou interrogação e também no diminutivo.
          A pronúncia em diminutivo do dialeto Montanhês não é usual e normal, como banco (banquinho), pouco (pouquinho), chão (chãozinho), etc. No Montanhês, o “NHA/O é substituído pelo “im
          Como exemplo, ajeitado fica ajeitadim, charmoso, fica charmozim, pouco, fica poquim, banco é banquim, tipo é tipim, caldo é caldim, chão é chãozim, feio é feim, etc.
          Isso porque o dialeto Montanhês é caracterizado pela supressão, acréscimos ou substituição de vogais, desde sua origem. Isso muda a pronúncia, a frase, a fonética e a forma de expressá-las por inteiro, evidentemente, a escrita é diferente da palavra no português original.
          Palavras com início ou final em "E” e “Te”, perdem o E no dialeto Montanhês. Isso faz com que a pronúncia seja mudada com o S e o T pronunciados de forma mais suave, baixa e o restante da palavra, mais acentuado e rápido.
          Como exemplo: casa (cas) estrada (strada), mesmo (mes), estudante (studant), está (sta), suporte (suport), norte (nort), estandarte, (standart), etc.
          Outra característica do dialeto montanhês é a pronúncia de nomes compostos de forma consecutiva e rápida, além da substituição da vogal E pelo I, se estiver no final da palavra.
          Como exemplos: Belo Horizonte pronuncia-se belohorizonti, Belo Oriente é belorienti, Itamonte é Itamonti, etc. A pronuncia é de forma consecutiva e rápida, com o I pronunciado de forma mais acentuada. 
          A vogal E no Montanhês é sempre pronunciada como se fosse I caso seja o E esteja entre as letras D, M e S. Por exemplo: destaque é distaque, desmiolada é dismiolada, destemido é distemido, demais é dimais, etc. 
          Em palavras com a vogal "O", esta letra é substituída pelo "U". Como exemplo Domingo é pronunciado como dumingu, despacho como dispachu, combinado como cumbinadu. Nesses casos, a pronúncia do U é bem forte e incisiva.
          No dialeto Montanhês o “O” é mudado para o ‘U’ em praticamente todas as palavras que possam ser pronunciadas com a fonética “U”.
          Em palavras com final “io”, a vogal O é suprimida. Citando como exemplos: feio, passa a ser fei, meio vira mei, arreio passa a ser arrei, rodeio, rodei, etc.
          Dependendo da palavra que termine com “io”, o O é substituído por dois “is”. É o caso por exemplo de palavras como pavio que passa a ser paviii. O “fio” do sotaque caipira é pronunciado em Montanhês por fiii, milho é miii, etc.
          Já o R no dialeto Montanhês é pronunciado em forma dupla, “rr”, retroflexo, ou seja, para dentro e não alongado como no dialeto caipira. Quando está no início de uma palavra, como exemplo rato que é pronunciado “rrato”. Se após o R tiver um O, substitui-se essa vogal por U, como exemplo, roer fica, “rruer”. A pronúncia dos dois "rr" é sempre arranhada.
         Quando uma palavra terminar com “ar” o R é pronunciado como “rr”, como exemplo cantar pronuncia-se cantarr, falar é falarr, etc.
         Palavras que terminam com “er” no final, tem o R excluído e recebe acento circunflexo no E, como por exemplo, saber que fica “sabê”, ter, passa a ser “tê, dizer é “dizê”, etc.
          Frases curtas ou longas onde tem a palavra "que' é necessário a divisão da letra Q e a pronúncia é feita como se fosse uma só palavra e rápido. Como exemplo: Que bom que você veio, fica "Q´bom q´ocê vei" ou q´bão q´cê vei". Quero falar algo com você, fica "Quero prosear um trem c´ocê". O que você está fazendo menino passa a ser "Q´cêtá fazend mininu?", etc.
          Uma das características básicas do dialeto Montanhês é a pronuncia de palavras pela metade e bem rápido, como exemplo, li (litro) vin (vinho) Vimdiminas (venho de Minas Gerais), Veio de onde? (vimdilá), etc.
          Essas são as características que formam parte do dialeto montanhês. A outra parte são palavras indígenas, africanas, portuguesas e inglesas, que passaram a fazer parte do dialeto Montanhês, ao longo da formação do Estado de Minas Gerais, no século XVIII e XIX.
          Palavras ou frases feitas nas características do dialeto Montanhês não são erros de português ou pronúncias erradas, é dialeto.
Dialeto Montanhês, Caipira e Sertanejo
          Dialeto Montanhês não tem nada a ver com o dialeto caipira e nem com o dialeto sertanejo. São dialetos diferentes, de origens diferentes, de regiões diferentes. Um tem origem em São Paulo e outro, no Centro Oeste do Brasil.
O dialeto Caipira
          O dialeto caipira tem origem no interior de São Paulo, durante a colonização. É um sotaque com a forte influência do português usual dos bandeirantes paulistas e de idiomas indígenas, presentes neste estado durante a colonização.
          Foi no início do século XX que este dialeto foi estudado e caracterizado pelo folclorista, poeta, filólogo e ensaísta brasileiro Amadeu Amaral (1875/1929) descrito no livro "O dialeto Caipira", lançado em 1920.
          O dialeto caipira se expandiu pelas cidades de regiões de divisa de São Paulo com o leste e sul do Mato Grosso do Sul, norte do Paraná, sul de Minas e sul de Goiás.
          Tem como característica principal a ausência de alguns sons comuns na fonética da língua portuguesa, a exclusão de diágrafos como “ih” em palavras como atalho, filho, palha, milho, etc., ficando as palavras como fio, taia, paia, mio, etc, além de ser comum o uso de frases curtas com palavras no plural e no singular ao mesmo tempo, como exemplos “as coisa”, “as rua”, “as casa”, “as pessoa”.
          Outra característica predominante no dialeto caipira é o uso do “R” de forma alongada e arrastada. Essa letra é uma das formas mais características expressivas desse dialeto.
          A forma alongada e arrastada da pronúncia do “r” nesse dialeto tem origem da dificuldade dos indígenas que não conseguiam pronunciar o “r” chiado dos portugueses, ficando assim incorporado ao dialeto caipira.
          Nosso dialeto não é Caipira, é Montanhês!
O dialeto Sertanejo
          Sertanejo é quem vive no sertão, que significa uma região afastada do litoral e centro urbanos, pouco habitado e coberto por matas, caracterizado ainda por terras férteis.
          Nesse caso, o sertão brasileiro compreendia as terras entre Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal. A Região Centro Oeste do Brasil.
          O dialeto do Sertão ou dialeto Sertanejo, tem em sua origem em expressões dos indígenas que povoavam a região e de bandeirantes paulistas, quando da chegada das entradas e bandeiras à região, no século XVIII. 
          Os bandeirantes desbravaram o sertão em busca de ouro a partir de Desemboque, distrito de Sacramento, no Triângulo Mineiro. Com as bandeiras, vieram também escravos.
          Os paulistas tinham seu jeito próprio de falar, caracterizado como dialeto Caipira. Juntamente com os africanos e indígenas, deram origem à formação do dialeto do sertão.
          A partir das primeiras décadas do século XX, o Centro Oeste Brasileiro começou a receber intensa onda migratória, principalmente de paulistas e mineiros, sendo os mineiros, em grande maioria. Os migrantes foram para o sertão abrir estradas e ferrovias, com a onda migratória aumentando bastante partir da década de 1950, durante a construção de Brasília.
          Com a presença de migrantes de várias regiões brasileiras, o dialeto sertanejo passou a receber influências de dialetos de outras regiões. 
          Como os migrantes em sua maioria eram paulistas e mineiros, os dialetos desses dois estados influenciaram bastante na formação do dialeto Sertanejo, com as características desses dois dialetos, principalmente do Montanhês mineiro. 
          Boa parte de palavras pertencentes ao dialeto Montanhês, como por exemplo o Uai e o Trem, foram incorporadas ao dialeto do Sertão, graças ao grande fluxo migratório de mineiros à região Centro Oeste do Brasil, principalmente no Estado de Goiás.
          O dialeto sertanejo é bastante caracterizado em Goiânia, não apenas em seu estilo próprio de falar, mas na música, sendo a cidade referência na música do sertão no Brasil, a chamada Música Sertaneja.
           O Montanhês não tem nada a ver com o dialeto sertanejo, é o contrário, é o dialeto Sertanejo que tem a ver com o dialeto Montanhês, devido a enorme presença de migrantes mineiros à região, a partir de meados século XX. 
          Nosso dialeto não é Sertanejo, é Montanhês.
Influência de outros dialetos no Montanhês
          A influência de outros dialetos em Minas Gerais se limita às regiões mineiras que fazem divisas com estados do Sudeste, Centro Oeste e Nordeste.
          Como exemplo, estão as cidades na divisa com o Rio de Janeiro, que recebe a influência do sotaque carioca.
          Em cidades do Triângulo Mineiro, do Sul e Sudoeste de Minas, na divisa com o estado de São Paulo, nosso dialeto recebe influência do dialeto Caipira
          Tem ainda as cidades da região Noroeste de Minas, na divisa com Goiás, que recebe influência do dialeto Sertanejo e do Norte de Minas, na divisa com a Bahia, a influência do sotaque baiano.
          Ao mesmo tempo, tanto as cidades paulistas, goianas, baianas e fluminenses, que influenciam em nosso dialeto, recebem igualmente influências do dialeto Montanhês.
          Essas influências de outros dialetos ficam nas cidades de divisas e mesmo assim, passam a ser incorporados na pronúncia do dialeto mineiro, mas sem predominar no contexto geral.
          Mineiro não abandona o uai, o trem, o sô nunca e nem seu jeito charmoso e atraente de falar, seja onde for.
          O dialeto mineiro foi eleito pela plataforma de relacionamentos Happn em 2021, como o mais atraente do Brasil. A votação foi feita entre os seguidores da plataforma.
Características do sotaque Montanhês
          O dialeto Montanhês tem como característica o ritmo acentuado, em muitos casos, interrogativos e exclamativos, como exemplo:
- Né não sô?"
- Cê vai ou num vai?
- Tem base um trem desse não uai!
- Genducéu!
- Arreda es´trem prá lá!
- Dêxa di bobiça sô!
- Num faço idea mess!
- Pôe us trem na gibêra!
- Nó, tô cuma gastura danada!
- Para de encasquetar cum es´trem!
- Vô centá um trem nocê!
- Cê tá me remedando?
- Ataia logo essa prosa!
          É comum no Montanhês o uso reduzido de palavras como exemplo:
- Você - Cê
- Você está bom? - Cê tá bão?
- Quero apenas um pouco - Mi dá só um tiquim
- Nossa Senhora do Perpétuo Socorro – Nó
- Minha Nossa – Nuu
- Ônibus – Ons
- Até logo mais – Inté
- É bem longe – Né não! É logo ali ó!
- É longe – Que nada sô! É pertim
- Senhor e Senhora – Sô e Sá
- Levanta pra cima – Sunga pra riba
- Onde estou, pra onde vou? – Oncotô, pronconvô?
- Reduza ou encurta – Ataia
- Para você – Procê
-Bom dia, boa tarde ou boa noite - Bão
          Para susto, medo, dúvida, exclamação, interrogação, resposta, espanto e mais um pouco, a expressão é uma só: "uai!".
          Para comer, falar, apontar, querer algo, mostrar algo, comprar alguma coisa, para apontar onde dói, não ter palavras no momento, usar alguma coisa e outras tantas, é usada apenas uma palavra: "trem".
Dialeto e erros na expressão
          Com o êxodo rural para grandes cidades mineiras e de outros estados, o dialeto Montanhês passou a fazer parte do dia a dia dessas cidades.
          O dialeto Montanhês saiu do interior para as grandes cidades e se popularizou, graças ao grande fluxo migratório do interior para a capital e cidades de grande porte.
          A questão é que não era mais chamado de dialeto Montanhês e sim, caipira e sertanejo. No século passado, os que vinham do interior para as cidades grandes, eram caracterizados como caipiras, em muitos casos, por preconceito, devido a simplicidade e baixa escolaridade.
          Isso porque a falta de acesso à escola, era comum no século XX, principalmente na zona rural, onde concentrava a maior parte da população das cidades. A pouca leitura fazia com que o povo que vivia na roça, tive pouco domínio da pronúncia das palavras e da escrita correta.
Dialeto não é falar errado  
          Dialeto é uma coisa, falar errado, por falta de oportunidade de estudo, é outra. Como é de conhecimento de todos, uma das características do dialeto mineiro é encurtar palavras, justamente pelo jeito suave e rápido do mineiro falar.
          Tem expressões populares, tidas como pertencentes ao nosso dialeto, que são meramente expressões usadas por quem tem ou tinha pouco ou nenhum estudo, gerando expressões e pronúncias erradas do português.
          Dialeto surge com a formação de um povo, de uma cultura. Envolve tradições, folclore, religiosidade, simplicidade e estilo de vida. Surge e se desenvolve com o passar do tempo. No caso do dialeto Montanhês, desenvolveu-se desde o século XVIII, há mais de 300 anos.
          Em nosso dialeto não tem as expressões como beraba, berlândia, gizdifora, patiminas, manhaçu e nem Belzonte.
          Não falamos fui fondo, nóis vai, nem nóis tá, nóis fiquemo, nóis foi e nem outras tantas expressões que não passam de erros de pronúncia e gramática.
          É jeito errado de falar e não jeito regional de falar. Não é dialeto, é erro mesmo, seja por desconhecimento, baixa escolaridade ou modismo.
          As palavras e expressões do dialeto Montanhês, sempre esteve presente no folclore e na música regional de Minas Gerais e passou a ser mais difundido com a popularização das redes sociais, não com o nome original, o Montanhês, mas “mineirês”.
Onde surgiu esse tal mineirês?
          Sinceramente não sei. A palavra faz parte do cotidiano mineiro há muito tempo. Quem criou e porque, não consegui saber.
          Pelo que entendi, é a junção do gentílico do estado mineiro, com a palavra português. Mineir (mineiro) + ês (português) = "mineirês". 
          A ideia faz crer que nosso dialeto seria um idioma próprio. Todos os países tem seus idiomas oficiais e seus dialetos. Dialeto é simplesmente uma variedade do idioma oficial. Dialeto não é idioma.
          O idioma do povo mineiro o Português, o nosso dialeto é o Montanhês. Simples assim.
A popularização do tal “mineirês”
          Com a popularização da internet, a palavra “mineirês” começou a ser difundida e a ser conhecida como o dialeto mineiro, mesmo sem nunca ter sido.
          Cada hora é um tal “dicionário mineirês” que aparece, mas em sua maioria, com pouquíssimas expressões do nosso dialeto original, o Montanhês.
          São palavras que não passam de réplicas do erro de grafia e pronúncia do português e muitas até, são expressões novas, criadas graças a criatividade de nosso povo. 
          São palavras simplesmente inventadas e caracterizadas por figuras e imagens de pessoas simples, de roupas surradas, chapéu de palha, que vivem no interior e na roça, falando errado. É um completa falta de noção do que é dialeto e de nossas origens. Até mesmo a forma com que o mineiro é retratado é irreal pois mostra somente o povo interiorano, como se dialeto ou sotaque fosse algo restrito a uma camada da sociedade ou exclusiva do povo que vive no interior e na roça. 
          Dialeto não tem classe social. Pode ser falado por quem vive na roça, na cidade grande. Por quem tem só o ensino fundamental, médio ou universitário. Seja rico, classe média ou pobre.
Orgulho do nosso dialeto 
          Não temos que ter vergonha de nossas origens, de nossa história, da formação de nossa cultura e folclore e muito menos do nosso dialeto. Temos que valorizar o que é nosso, valorizar as nossas origens, o nosso jeito de ser e de falar.
          Dialeto não tem nada a ver com classe social ou nível de estudo. Tem a ver com a cultura, religiosidade, folclore, saberes, sabores e jeito de ser e viver um povo. Simples assim.
          Esse tal “mineirês” virou moda e fez escola pelo Brasil, incentivando a criação de outros nomes, juntando gentílicos com o português dos estados. Assim, começou a surgir o “goianês”, o “baianês”, etc.
Dialeto não é modismo, piada e nem brincadeira de internet
          Dialetos tem origens seculares surgidos com o tempo, durante a formação de cidades, estados e regiões.
          Dialeto simboliza a história, a cultura, o folclore, os ofícios, a religiosidade e tradições de uma região.
          Não é brincadeira, modismo ou para virar piada em memes. Dialeto é coisa séria, é para ser estudado, compreendido e respeitado, por que é fruto da história de um povo.
          Em sua origem, o dialeto do povo mineiro, é o Montanhês. Tem origem secular. Foi formado ao longo de quase 300 anos. Montanhês tem a ver com nossas montanhas, com a nossa riqueza, com as nossas belezas, com nossa cultura, com nossa música, com nossa mineiridade.
          Somos de Minas Gerais, somos mineiros, somos brasileiros. Nossa língua é a Portuguesa, nosso dialeto é o Montanhês!
          Somos mineiros e não falamos esse tal de "mineirês". Somos mineiros e nossa língua é a Portuguesa e nosso dialeto é o Montanhês. 
(Aviso legal:  reprodução não permitida sem autorização formal de Arnaldo Silva)
As imagens que ilustram a matéria fazem parte da arte em porcelanas e canecas esmaltadas da Thalyta Moreira/@amoreira_loja

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

O charme, requinte e a arte das Aldravas

(Por Arnaldo Silva) Aldrava é um objeto hoje pouco conhecido e pouco visto, já que foi substituído ao longo do tempo pela campainha e interfone. Também chamadas de aldrabas, são aqueles charmosos batedores que ficam nas portas dos velhos casarões de nossas cidades históricas.
          Feito em ferro, metal ou em bronze, tem o formato de argola ou mesmo, alguns acompanhados de detalhes artísticos. São fixadas por parafusos às portas e batentes das casas. (imagens acima de César Reis, de aldravas em Tiradentes MG)
          A aldrava tem a função usada por visitas para chamar o dono da casa. Basta fazer movimento batendo com a argola na madeira da porta, que fará um barulho, alertando o dono da casa quando alguém chegasse. Servia ainda para trancar as portas por fora. (na fotografia acima de Arnaldo Silva/@arnaldosilva_oficial, uma aldrava com fechadura, fotografada numa rua em Ouro Preto MG. O saquinho pendurado acima é de pão, deixado pelo padeiro)
Origem Greco-Romana
          Tem origem na Grécia e Roma, na Idade Média. Foi por séculos, um prático sistema de anunciar a chegada de alguém.
          Aldrava ou aldraba vem do Árabe Ad-Dabbã, que significa ferrolho. Foi desenhada para ser tranca e também, para bater na porta. O próprio dicionário da língua portuguesa define aldrava como: “Peça de ferro, com que se bate às portas, a que se prende, para chamar”. (Na imagem acima de César Reis, uma aldrava em Tiradentes MG)
As primeiras aldravas
          Em sua origem eram bem rústicas, em formato de argola simples e sem detalhes. Foi no período neoclássico que as aldravas começaram a serem feitas em ferro fundido, recebendo ainda detalhes artísticos, feitos pelas mãos de renomados artistas europeus. (na foto acima, aldrava em estilo rural, na porta da casa da Regina Kátia na Flórida/USA)
          De rústicas, as peças ganharam detalhes artísticos, inicialmente inspirados na arte egípcia. Com isso, as aldravas ganharam formas de flores, animais, seres da mitologia, mãos e cabeças de homens e mulheres, medusas e esfinges. (na imagem acima, aldrava em estilo rural na porta da casa de Regina Kátia/@reginasfarm)
          Coube aos artistas italianos e espanhóis dar mais charme, glamour, beleza e requinte às aldravas, transformando-as em magníficas e impressionantes obras de arte, presentes até hoje nas cidades turísticas da Itália e Espanha, bem como em toda a Europa. 
Na América Latina e Brasil
          As aldravas foram introduzidas na América Latina pelos colonizadores espanhóis e no Brasil, pelos portugueses, decorando casarões coloniais construídos nesse período, principalmente nas cidades históricas mineiras. (fotografia acima de César Reis em Tiradentes)
          Em cidades como Diamantina, Mariana, Paracatu, Congonhas, Ouro Preto, Serro, Sabará, Caeté, etc., as aldravas podem ser vistas ao andar pelas ruas dessas cidades.
Esquecidas no século XX
          Os portugueses introduziram em Minas Gerais e no Brasil, seu estilo arquitetônico, com os casarões construídos rente às calçadas. As aldravas, bem trabalhadas, com ricos detalhes artísticos, estavam sempre presentes nas residências da fidalguia e também, da população em geral. (na foto acima de Arnaldo Silva/@arnaldosilva_oficial, aldrava na porta de um dos quartos da Casa dos Contos em Ouro Preto MG e ainda em Ouro Preto, duas aldravas com fechadura, fotografada pelo Alexandre Pastre)
          A mudança no estilo arquitetônico e posição das casas mudaram a partir do século XX. Hoje, as casas não são mais construídas rente aos passeios. As portas das casas, passaram a ser substituídas por portas em metal e as casas separadas da calçada por muros e varandões.
          No lugar das aldravas, graças à popularização da eletricidade, surgiram as campainhas e interfones modernos. Com isso, a peça ficou no passado e até o nome aldrava, passou a ser desconhecido pela maioria.
          Mesmo quem tem ou já viu aldrava, não sabia que o nome da charmosa peça é Aldrava.
Ainda existem
          As aldravas são até os dias de hoje fabricadas por empresas de fundição. As aldravas mais antigas e bem trabalhadas artisticamente, podem ser encontradas em antiquários.
          Aldrava hoje é um objeto decorativo, que dá mais charme e nostalgia à uma casa, principalmente se esta for em estilo colonial e barroco.

Formulário de contato

Nome

E-mail *

Mensagem *

Facebook

Postagens populares

Seguidores