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domingo, 19 de dezembro de 2021

1910: ano que Minas comprou acesso ao mar

(Por Arnaldo Silva) Minas encanta por seus rios, paisagens naturais, culinária, cachoeiras, arquitetura, hospitalidade e deslumbrantes montanhas. Um cenário idílico e cinematográfico, chegando à quase perfeição de tão espetacular que é.
          
Só falta o mar, banhar Minas, o que já aconteceu. Isso foi há pouco mais de 120 anos. O “litoral mineiro” era formado por 12 km de largura e 142 km de extensão. São 12 km de praia.
          Esse pedaço de chão “mineiro”, iniciava em Serra dos Aimorés/MG na Divisa com a Bahia, seguindo pelo extremo sul baiano, até Ponta de Areia, no Oceano Atlântico (na foto ilustrativa acima do Tom Alves/@tomalvesfotografia, a costa sul da Bahia, em Porto Seguro)
A Estrada de Ferro Bahia e Minas
          Esse filete de terra fazia parte dos 578 km de extensão da Estrada de Ferro Bahia e Minas. Inaugurada em 1881, ainda a época do Império, a ferrovia ligava Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, a Ponta de Areia, distrito de Caravelas, no litoral baiano. Foi construída pela Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas, em parceria com o Governo de Minas. (na fotografia acima do Sérgio Mourão/@sergio.mourão, Pontilhão da EFBM sobre o Rio Mucuri)
          A ferrovia foi desativada em 1966, na época do Governo Militar, sob o argumento de que asfalto e transporte rodoviário, traria mais desenvolvimento para a região, do que manter os trens de passageiros. Na visão dos políticos do século XX, asfalto significava desenvolvimento e trilhos, atraso.
          Optaram então por desativar as ferrovias e abrir estradas. Na verdade, esse era o argumento para o desmonte da malha ferroviária brasileira, desde Juscelino Kubistchek, sacramentado durante os 20 anos do Governo Militar no Brasil. Com o fim dos trilhos, estradas federais (BR´s) e rodovias estaduais, começaram a serem abertas por todo o Brasil. Saíram os trilhos e os trens, entrou o asfalto, caminhões, ônibus e carros.
A compra que ficou na história
          Essa história começou em 1881, ainda no período imperial com a criação da Estrada de Ferro Bahia e Minas com a abertura da linha férrea que ligava o Vale do Jequitinhonha, ao litoral da Bahia, construído e gerenciado pela Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas.(na foto acima da do Sérgio Mourão/@sergio.mourão, Estação Caporanga em Novo Cruzeiro MG)
          A visão da época era ligar o Brasil através dos trens para escoar a produção agroindustrial e ligar cidades e pessoas, através dos trens de passageiros. O trem significava desenvolvimento e encurtava a distâncias num país de dimensões continentais, como o Brasil
          Para incentivar os investimentos privados nas ferrovias, o Imperador do Brasil, Dom Pedro II (1825/1891), criou vários incentivos. No caso da Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas, Dom Pedro II concedeu à empresa, 12 km de extensão de terras devolutas, margeando os trilhos, por 142 km, em território baiano, na divisa com Minas Gerais. Eram seis quilômetros em cada lado da ferrovia.
          No início do século XX, na era republicana, a companhia começou a enfrentar dificuldades financeiras, tendo que recorrer a financiamento junto ao Banco de Crédito Real do Brasil, hipotecando 142 km das terras devolutas da ferrovia, concedidas à época do Império.
          O financiamento não foi pago e em 1908, o banco executou a dívida, ficando com as terras devolutas do extremo sul baiano. Em 1910, o próprio banco entrou em liquidação, com seu patrimônio tendo sido liquidado.
Governo de Minas compra as terras hipotecadas
          Ciente disso, o Governo de Minas à época, se interessou pelas terras hipotecadas pelo banco. Foi feita a compra, no valor de 300:000$000 (trezentos contos de réis, algo em torno hoje de R$40 milhões), pagos com títulos da dívida pública, lavrada em escritura de cessão de crédito e transferência de direito. (na foto acima de Sérgio Mourão/@sergio.mourão, antigo túnel da EFBM em Ladainha MG)
          Há época, a compra dessas terras significava a ligação que faltava de Minas Gerais com o Oceano Atlântico.
          Pagou, mas não levou. A grande questão a saber é por quê Minas Gerais não levou, pelo que pagou.
Minas comprou o acesso ao mar
          Dos 578 km de extensão da ferrovia, Minas Gerais comprou 142 km do trecho, com margem de 12 km, sendo seis km de cada lado, pertencentes à Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas iniciando em Serra dos Aimorés/MG, na divisa com a Bahia. 
          Em território baiano, essas terras margeavam a ferrovia, passando por Argolo, Posto da Mata e Helvécia, distritos de Nova Viçosa/BA, Aparaju, distrito de Alcobaça/BA, entrando na cidade histórica de Caravelas/BA e estações nos seus distritos de Juerana, Barra de Caravelas e Ponta de Areia, na Costa Sul da Bahia.
          O km 0 da Ferrovia Bahia e Minas era Ponta de Areia, na Bahia e o km 578, final, era em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha. (na foto acima de Sérgio Mourão/sergio.mourao, a Estaçaõ Queixada em Novo Cruzeiro MG)
Por que Minas não explorou as terras compradas?
          Minas não tomou posse de imediato de sua compra. Entre 1908 e 1910, época da aquisição das terras do litoral baiano, Minas Gerais vivia momentos conturbados em sua vida política, com trocas constantes de governadores, em espaços curtos de tempo, além da questão do Contestado, entre Minas e Espírito Santo e outros problemas.
          O primeiro foi Júlio Bueno Brandão que governou o Estado de 27/10/1908 até 03/04/1909, quando nesse dia, assumiu Wenceslau Brás Pereira, se afastando em 05/02/1910. Em seu lugar, assumiu o governo mineiro, Antônio do Prado Lopes Pereira, que ficou no cargo até 21/03/1910, quando Wenceslau Brás Pereira, retornou ao cargo, ficando até 07/09/1910. Em seguida, assumiu o Governo de Minas, Júlio Bueno Brandão, que voltou ao governo, ficando no cargo até 07/09/1914.
          Com o momento conturbado da vida política mineira, a compra do acesso ao mar, acabou ficando em segundo plano. Com o tempo, esquecido por completo e até mesmo, desconhecido por boa parte dos governadores mineiros e do próprio povo, que desconhecia essa história.
          Isso porque a compra foi um ato corriqueiro do Estado e não teve muito alarde à época, ficando o assunto restrito ao círculo político e empresarial mineiro da época.
          Boa parte dessa região do extremo sul baiano, onde passavam os trilhos da “Baiminas”, estão hoje em áreas de manguezais, sistema de transição entre o ambiente terrestre e marinho, portanto, áreas de preservação ambiental.
“Olha aí o Mar de Minas”
          Décadas depois, a história do Mar de Minas volta à tona pelas mãos de Fernando Brant, mineiro, natural de Caldas MG. Formado em direito e um dos grandes compositores brasileiros, com mais de 200 músicas feitas em parceria com Milton Nascimento. (imagem ilustrativa acima do Deocleciano Mundim, praia do litoral Sul da Bahia)
          Na a partir da década de 1960, se dedicou ao jornalismo, exercendo a função de repórter em veículos de comunicação, entre eles, a extinta Revista O Cruzeiro.
          Na revista O Cruzeiro, uma de suas reportagens de maior impacto, feita em 23 de maio de 1973, com o título ‘Olha aí o Mar de Minas”, trouxe de volta à tona a questão das terras do litoral baiano compradas por Minas Gerais em 1910 e esquecida há décadas.
          A reportagem teve grande repercussão e discussão à época, deixando boa parte dos mineiros perplexos. Isso porque, a ligação de Minas ao mar da Bahia era desconhecida pela maioria dos mineiros e até das autoridades.
          Viajando até a região fazendo fotos, entrevistas e pesquisando fatos e documentos sobre a compra feita por Minas das terras baianas, Fernando Brant fez uma reportagem que entrou para a história da imprensa mineira. Mais que isso, graças ao alcance da revista, mineiros e baianos tomaram conhecimento de um fato sequer imaginado até então. Minas tinha acesso ao mar.
          Além da reportagem, o tema inspirou Fernando Brant, que compôs, em parceria com Milton Nascimento, Ponta de Areia, uma de suas mais populares canções.
          “...Ponta de areia, ponto final, da Bahia a Minas, estrada natural, que ligava Minas, ao porto, ao mar, caminho de ferro mandaram arrancar...” é um dos mais nostálgicos e emocionantes versos da música, composta durante sua viagem de trabalho à região.
          Em um dos trechos da reportagem, Fernando Brant descreve a possibilidade de Minas ter acesso ao mar: “É o fim da nostalgia do mar. Minas Gerais já têm o seu, de direito, desde 1910. O Cruzeiro descobre e mostra documentos e fatos que comprovam: Minas é um estado marítimo. A história começa no segundo Império e se arrasta até hoje (23/05/1973), encoberta por inexplicável silêncio”.
          Mesmo sendo um pequeno trecho de terras, Fernando Brant valorizou a importância da aquisição do Governo de Minas, em 1910: “É apenas um fiapo no mapa, mas é o quanto basta para Minas. Um fio de linha, uma modesta e tímida maneira de se chegar ao mar. O direito real é aclarado pelos documentos; falta a posse de fato para que o mineiro possa um dia dizer, debaixo das amendoeiras de Grauçá e Aracaré: ‘Olha aí o nosso mar’”.
O Contestado
          Fernando Brant deixa bem claro na reportagem que a compra das terras baianas pelo governo mineiro, não tinha relação alguma com o Contestado, uma disputa territorial entre mineiros e capixabas, que quase culminou em guerra entre os dois estados.
          O Contestado começou no início do século XVIII, quando o Rio Doce foi aberto a navegação, dando início a ferrenha disputa sobre a divisões territoriais entre Minas Gerais e o Espírito Santo. 
          Mineiros e capixabas contestavam as divisões territoriais em suas divisas, seja na esfera politica, judicial e até armada, com os dois estados vivendo décadas de tensão de um possível conflito armado. 
          Tropas mineiras e capixabas se entrincheiraram em suas divisas, com o conflito se intensificando no início do século XX, tendo como epicentro a região de Mantena no Vale do Rio Doce e Barra do São Francisco, Noroeste do Espírito Santo.
          A situação começou a ser resolvida a partir de 1958, quando os dois estados decidiram retirar suas tropas das divisas em busca de um acordo de paz entre mineiros e capixabas.
          Em 1963 o conflito foi finalmente resolvido, quando as armas deram lugar ao diálogo e consequentemente, definições das divisas territoriais de Minas Gerais e Espírito Santo. O acordo foi firmado entre o Governador de Minas Gerais à época, Magalhães Pinto e Lacerda Aguiar, do Espirito Santo. 
          Durante os mais de 150 anos de disputa entre mineiros e capixabas, não houve guerra declarada, mas ocorreram ao longo desses anos todos, confrontos armados isolados. O saldo, entre mineiros e capixabas, foi um incontável saldo de mortes de ambos os lados, entre civis e militares.
          Por isso Fernando Brant, deixou bem claro, em um dos trechos de sua reportagem que a compra das terras baianas por Minas, em 1910, ligando o Estado ao mar, não tinha nada a ver com a disputa dos mineiros com os capixabas de 1800 a 1958. “Não se trata do Contestado, motivo de tanta briga, em passado recente, entre mineiros e capixabas. Uma briga inútil, pois, desde 1910, trezentos contos de réis tornaram Minas Gerais proprietário, de direito, de um trecho no extremo Sul da Bahia, que vai dar em Caravelas, Ponta de Areia e Barra de Caravelas”.
O que significa a compra de terras baianas?
          Minas Gerais não comprou terras do Governo da Bahia e sim, terras pertencentes à Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas, hipotecadas pelo Banco de Crédito Real do Brasil. O negócio foi feito entre o Governo de Minas e o banco, que tinha posse das terras. Nenhum centavo foi pago ao Governo da Bahia e nem o tema foi discutido ou negociado entre os dois governos na época. (na foto acima do Sérgio Mourão/@sergio.mourao, a Estação de Novo Cruzeiro MG)
          O fato de Minas Gerais ter adquirido terras em outro estado da Federação, não significa um acréscimo à extensão territorial de Minas Gerais e nem pode. Os estados são soberanos em suas divisas.
           O que Minas fez foi o que qualquer pessoa jurídica ou física no Brasil pode fazer. Comprar bens e imóveis à venda em território nacional. Evidentemente, respeitando-se as leis vigentes nos estados.
          Foram simplesmente terras adquiridas da iniciativa privada que Minas Gerais pagou, mas não levou. E ainda, não recebeu de volta o dinheiro gasto com a compra. Ao menos, é o que se sabe.
          Como foi uma compra escriturada e documentada, cabe uma análise mais detalhada da documentação, saber onde foi registrada, de qual instituição sucedeu o extinto banco e o destino de sua massa falida, para uma análise mais profunda desta questão.
O que fez o governo mineiro?
          Desde 1910, apenas três governadores se interessaram pelo tema. (na arte acima, trecho de 12 quilômetros de largura por 142 quilômetros de extensão da Bahia e Minas, adquiridos por Minas, que inicia na atual divisa com a Bahia, se estendendo as praias do sul baiano, em Ponta de Areia. Arte Jornal O Estado de Minas/divulgação)
          O primeiro foi Milton Campos que governou Minas de 19/03/1947 a 31/01/1951. Ao tomar conhecimento dessas terras adquiridas por Minas Gerais em 1910, Milton Campos solicitou oficialmente informações ao Governo da Bahia sobre a questão. Não obteve resposta ou pelo menos, não tornou público a resposta do governo baiano, com o caso voltando ao esquecimento.
          Nos anos 1980, durante o Governo Newton Cardoso (15/03/87 a 15/03/1991), também ocorreu discussões na imprensa e governo sobre as terras que Minas teria comprado da Bahia, mas não houve avanços na discussão do Governo Mineiro sobre a questão.
          Em 19 de agosto de 2015, após uma série de reportagens e vídeos do Jornal O Estado de Minas, baseada na matéria da Revista O Cruzeiro em 1973, trouxe novamente à tona, a questão do Mar de Minas, no litoral baiano.
          A reportagem e os vídeos feitos pelo Jornal O Estado de Minas sobre a Ferrovia Bahia e Minas, teve enorme repercussão, despertando novamente o interesse do povo mineiro pela intrigante história do acesso de Minas ao Oceano Atlântico. 
          O próprio governador de Minas Gerais, à época, Fernando Pimentel (2015/2019), se interessou pela história, mas sem nenhuma conclusão final sobre o assunto. 
          Apenas a reafirmação de que não foi encontrado no mapa de Minas Gerais, nenhum acréscimo da citada faixa de terras adquiridas em 1910. E o assunto parou por ai.
          Minas Gerais comprou terras hipotecadas de um banco. Não foi um acordo de extensão territorial entre governos, por isso não podia ser inserida no mapa geográfico de Minas. As divisas de Minas Gerais com a Bahia foram definidas pelo decreto 24.155 e não pode ser mudada.

          Na época, a reportagem do Jornal O Estado de Minas, consultou o governo baiano sobre a questão, que respondeu não ter nenhuma informação sobre o assunto.
          Assim, retornou ao silêncio e esquecimento, a curiosa, interessante e intrigante história do “Mar de Minas”, sem ainda um capítulo final.
O que fazer com as terras que Minas comprou?
          A reivindicação das terras adquiridas por Minas Gerais, em 1910, não se discute. O Estado da Bahia é soberano em suas divisas, como todo estado brasileiro é. Seria uma discussão desnecessária e totalmente inútil no momento.
          O que se discute hoje é a reativação desse trecho, ligando novamente Minas Gerais ao litoral baiano, para transporte de cargas e passageiros. Mas através de discussão, interesse e acordo, envolvendo o Governo Federal, Governo da Bahia, Governo de Minas e iniciativa privada. Seria ótimo para Minas Gerais, Bahia e Brasil.
         Se não conseguir a reativação total do trecho, ao menos em partes, colocando nos trilhos, trem de passageiros, para fins de passeios turísticos, o que facilitaria a vida dos mineiros da região.
         Isso porque, mineiros do Vale do Mucuri, Norte de Minas e Vale do Jequitinhonha, são frequentadores assíduos das praias do extremo Sul da Bahia, como exemplos, Porto Seguro, Prado, Ponta de Areia, Alcobaça, Abrolhos e Trancoso, além das cidades históricas baianas como Caravelas, fundada em 1503, dentre outras. (na foto acima do Deocleciano Mundim, praia no litoral Sul da Bahia)
          É uma discussão longa e uma luta para sua concretização, mais longa ainda. Mas a sociedade brasileira vem se conscientizando da importância da volta dos trens, buscando sensibilizar deputados, governos estaduais e o governo Federal, sobre a importância da volta dos trens de passageiros.
         Seria também uma redenção econômica da região, principalmente das cidades do Vale do Jequitinhonha, que foram bastante afetadas em suas economias e crescimento, com a extinção da ferrovia em 1966.
          A reativação do trecho da Bahia e Minas, de Araçuaí a Ponta de Areia ou em partes, está em discussão por iniciativa popular, sem nada de concreto por enquanto, bem como a reativação de antigos ramais e construções de novos por todo o Brasil. A iniciativa vem do povo, que ver trilhos lingado todo o Brasil, não apenas transportando cargas, mas passageiros.
A necessidade dos trens de volta aos trilhos
          No século XXI, o debate da volta dos trens de passageiros, surge como solução como o melhor transporte de massa, principalmente em regiões metropolitanas.
          Além disso, trens facilitam a ligação de regiões brasileiras, reduz os gastos com manutenção de estradas, gera lucros, empregos, renda e desenvolvimento. Era esse o objetivo, quando da criação dos trilhos no Brasil no século XIX. Essa velha teoria, implantada por Dom Pedro II, não perdeu validade, está mais que atual e necessária, hoje.
          A volta dos trens é mais que um anseio e apelo popular. E uma necessidade devido ao aumento crescente da produção agroindustrial, e da necessidade urgente de alternativas de transportes de massas, nas grandes cidades, principalmente.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

A padaria centenária do Pão do Padre de Santa Bárbara

(Por Arnaldo Silva) Fundada em 4 de dezembro de 1704, Santa Bárbara é uma das mais antigas cidades mineiras. Com cerca de 32 mil habitantes e distante 105 km da Capital, na parte central da Estrada Real, a cidade histórica faz divisa com Alvinópolis, Barão de Cocais, Catas Altas, Itabirito, Mariana, Ouro Preto, Rio Acima, Rio Piracicaba e São Gonçalo do Rio Abaixo. O acesso à cidade pode ser feito pela BR-381 e BR-262 e MG-436.
          Cidade idílica, agradável, tranquila e acolhedora. Suas riquezas naturais e paisagens bucólicas, como a imponente Serra do Caraça, faz de Santa Bárbara uma das mais belas cidades de Minas. Seu povo é hospitaleiro e bem simples e sua história é preservada em sua arquitetura colonial, bem como nas tradições culturais, folclóricas, gastronômicas e religiosas, preservadas há mais de 300 anos. (na fotografia acima de Judson Nani, o Pão do Padre com a Igreja de do Rosário ao fundo)
          Uma dessas tradições mais valiosas de Santa Bárbara é a culinária típica, principalmente, as quitandas que saem dos fornos das casas e padarias da cidade.
Padaria União – A mais antiga de Minas
         Uma dessas padarias é a Padaria União, em atividade desde 1911. A padaria fica na Rua João Mota, 107, no Centro da cidade.
          É a mais antiga padaria familiar em atividade de Minas Gerais e uma das mais antigas do Brasil, já na terceira geração da mesma família. Hoje é administrada por Rubens Nelson Magalhães Santos, que herdou a tradição de seu pai, Raymundo Cândido dos Santos Filho. (na foto acima de Judson Nani, a Padaria União e abaixo, fotos das três gerações da família fundadora da Padaria União)
          Desde sua origem, a Padaria União formou uma ampla e fiel clientela, graças ao empenho, dedicação dos pioneiros, bem como pela qualidade das guloseimas que saem de seus fornos, principalmente, o tradicional Pão do Padre.
          Este pão é o carro chefe de toda panificadora, mas na Padaria União e para Santa Bárbara, é bem mais que isso. O Pão do Padre e tornou um símbolo da própria cidade e da própria história da padaria, desde sua fundação. (na imagem abaixo, o folder de 2011 comemorativo dos 100 anos da Padaria União).
A história do Pão do Padre
          A 30 km do Centro de Santa Bárbara, está o Santuário do Caraça. No século XIX, no Caraça funcionava um colégio, bem como o seminário, da Congregação dos Lazaristas. (na foto acima de Judson Nani, a Matriz de Santo Antônio em Santa Bárbara MG e o Pão do Padre)
          Fazer pão e atender toda a cidade, naquela época, era muito difícil. Não era fácil encontrar trigo no Brasil, era muito pouca a produção nacional. Era importado. O transporte também era difícil.
          Além disso, transportar as guloseimas era outra dificuldade, principalmente quando os fregueses viviam mais distantes, como por exemplo, os padres e seminaristas do Santuário do Caraça. Era uma época de estradas de terra. Carros era raridade na época no Brasil. As encomendas eram transportas em carroças e carros de bois.
          Mesmo com todas as dificuldades de transporte, com frio ou chuva, os pães chegavam ao seu destino. Eram levados até o Santuário do Caraça e cidades da região em barricas colocadas em lombos de burros e em carroças. Assim garantia-se o pão de cada dia dos padres e dos moradores das redondezas.
          Quem recebia o pão sagrado do café da manhã, rotineiramente, eram os padres e seminaristas do Santuário do Caraça, distante 30 km do centro de Santa Bárbara. Logo pela manhã, seja com chuva ou frio, as barricas com guloseimas como pão de milho e o nosso tradicional pãozinho, saiam nos lombos dos burros e chegavam até os padres do Santuário.
           As guloseimas agradavam aos padres e seminaristas, principalmente o pão, que regularmente chegava até o seminário, garantindo assim o café da manhã dos padres que recebiam a iguaria. Antes do desjejum, rezavam, agradecendo e abençoando o pão de cada dia que recebiam.
          Por isso o pão ganhou o nome de Pão do Padre. Também chamado de Pão Santo, embora não se tenha registro de milagres recebidos por quem compra ou consome o pão, se tornou sagrado nas mesas dos moradores da região. Está sempre presente no café da manhã e na merenda da tarde, alimentando o corpo e a história de uma das mais antigas receitas mineiras.
           O Pão do Padre, é o queridinho de Minas, a mais antiga e mais popular receita que saiu dos fornos da Padaria União, de Santa Bárbara MG, há mais de 120 anos. Seu sabor lembra um pouco o famoso Pain de Brié, pão de origem francesa.
A receita do Pão do Padre
          Evidentemente que não irá ficar igual ao tradicional Pão do Padre, feito na Padaria que criou a receita, a Padaria União, já que conta com seus segredos próprios. Mas a receita é basicamente a que segue. (foto acima de Judson Nani com a Igreja do Rosário ao fundo)
INGREDIENTES PARA A PRIMEIRA MASSA
. 100 ml de água fria
. 100 gramas de fermento biológico fresco
. 100 gramas de farinha de trigo.
INGRENDIENTES DA SEGUNDA MASSA
. 1 quilo de farinha de trigo
. 200 ml de água
. 4 ovos grandes
. 200 gramas de manteiga em temperatura ambiente
. 150 gramas de açúcar cristal
. 1 pitada de sal
.. Gema de ovo para pincelar
MODO DE PREPARO DO PÃO DO PADRE
- Coloque numa vasilha a água, o fermento e a farinha de trigo, ingredientes da primeira massa e amasse com as mãos, até ficar uma mistura homogênea. Faça uma bola com a massa e deixe descansando por 15 minutos.
- Enquanto isso, comece a preparar a segunda massa.
- Coloque numa vasilha a farinha de trigo, os ovos, a manteiga, a pitada de sal e o açúcar. Misture tudo com as mãos.
- Vá despejando aos poucos a água e amassando, até que a massa fique lisa e bem firme. Se precisar, acrescente mais água.
- Pegue agora a primeira massa que deixou descansando e misture à segunda massa e sove bastante, até que esteja bem firme e desgrudando das mãos.
- Divida a massa em quatro partes e faça moldes no formato de baguete.
- Faça cortes horizontais e verticais sobre a massa com uma faca e em seguida, pincele a parte superior com gema de ovo.
- Coloque os pães em fôrmas já untadas com óleo e cubra com um pano. Deixe descansando em temperatura ambiente por 150 minutos.
- Leve ao forno pré-aquecido a 180 graus e deixe assando por cerca de 20 minutos ou até começar a dourar.
- Por fim, sirva com café!
          Ao visitar Santa Bárbara, conheças as belezas naturais e históricas da cidade e claro, visite a Padaria União, bem no Centro da cidade e aprecie as guloseimas feitas na Padaria, principalmente o Pão do Padre.

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

O Caminho de Saint-Hilaire na Serra do Espinhaço

(Por Arnaldo Silva) O caminho percorrido por Saint-Hilaire, quando esteve na Região do Espinhaço e Vale do Jequitinhonha, no século XIX, se transformou num roteiro turístico de 170 km de trilhas, pela Serra do Espinhaço.
          Com a sigla CASHI (Caminho de Saint-Hilaire), o roteiro tem início em Conceição do Mato Dentro, cidade distante 170 km de Belo Horizonte, terminando na cidade Patrimônio Cultural da Humanidade, Diamantina, a 292 km da Capital. (na foto acima do Nacip Gômez, a Cachoeira do Tabuleiro em Conceição do Mato Dentro, com 273 metros de queda livre. A maior de Minas)
          Idealizado pelo turismólogo Luciano Amador Santos Júnior, presidente do Instituto Auguste de Saint-Hilaire, o Cashi tem como objetivo estimular o turismo ecológico e saudável.
          Além disso, o percurso percorrido pelo naturalista francês há mais de 200 anos, permite uma viagem pelos sabores, saberes e fazeres das cidades e vilarejos, ao longo de todo o percurso do Caminho de Saint-Hilaire. (na foto acima de Nacip Gômez, vista parcial da cidade de Conceição do Mato Dentro)
Uma rota turística
          O Cashi é uma nova rota turística mineira, pela Cordilheira do Espinhaço. Cordilheira é um conjunto de montanhas relacionada geologicamente, no caso, a Serra do Espinhaço é uma extensão relacionada de cerca de 1 mil km, com largura entre 50 e 100 km.
          A Cordilheira do Espinhaço inicia na região do Caraça em Catas Altas, seguindo de forma contínua até a divisa de Minas, com o Sul da Bahia. (na foto acima de Elvira Nascimento, Diamantina e ao fundo, o maciço rochoso do Espinhaço)
          Todos os 170 km do percurso são feitos a pé. Há estudos para estruturar a trilha, com sinalização e demais adequações, para que o trajeto seja feito também por praticantes de cicloturismo e ecoturismo.

Duração do percurso
          Os 170 km do Cashi são percorridos entre 10 a 11 dias pelos caminhantes. Os grupos são pequenos, formado por 10 a 15 pessoas, acompanhadas por guias.
          Durante o trajeto, acontecem paradas para conhecer as cidades e vilarejos, bem como as cachoeiras, mirantes e paisagens pelo caminho. À noite, o grupo para em pousadas para descansar e seguir caminho, no dia seguinte. (na fotografia acima de Tom Alves/@tomalvesfotografia, parte da Serra do Espinhaço)
          Os 170 km do Cashi, percorre as deslumbrantes paisagens da Serra do Espinhaço, que encantaram Saint-Hilaire como as belezas naturais, a riqueza da fauna e flora.
          O caminhante terá ainda a oportunidade de conhecer a sabedoria do povo, preservada por gerações, como a medicina popular através das ervas e raízes, bem como o benzimento para todo tipo de males do corpo e espírito, praticado por benzedeiras e benzedeiros.
Cidades e vilarejos do Cashi
          Em todo o percurso, os caminhantes passarão por vilas, povoados e distritos charmosos e bem pitorescos, além de cidades formadas durante o Ciclo do Ouro.
          Saindo de Conceição do Mato Dentro, os caminhantes seguem rumo aos Córregos e Tapera, seguindo para Itapanhoacanga (na foto acima da Luciana Silva), distrito de Alvorada de Minas, passando por Mato Grosso, distrito do Serro, indo em seguida, para Condado, continuando até Três Barras da Estrada Real, Milho Verde e São Gonçalo do Rio das Pedras, distritos do Serro. Segue até Vau, já no município de Diamantina, continuando até Capão Maravilha e Curralinho, também em Diamantina, até encerrar o trajeto, na terra de JK e Chica da Silva.
Um caminho pelos sabores e tradições de Minas
          Percorrer todo o caminho feito por Saint-Hilaire é uma aventura de puro êxtase, além de propiciar aos caminhantes conhecer, desfrutar e sentir as belezas naturais de Minas Gerais, bem como sua cultura, artesanato, arquitetura e o estilo de vida simples do povo das alterosas.
          Além disso, pode-se experimentar e saborear as delícias da culinária mineira, também relatadas por Saint-Hilaire em suas andanças pela região, como o Queijo do Serro, além dos tradicionais vinhos finos que saem das várias vinícolas de Diamantina, tradição na cidade desde o século XVIII. (na foto acima de Elvira Nascimento, chegada a Milho Verde, distrito do Serro MG)
          Sem contar os pratos típicos da culinária mineira, como doces, pão de queijo, licores, biscoitos, além da intensa vida cultural da região como a Bolerata do Serro e a Vesperata de Diamantina, as festas folclóricas como a Festa do Divino, do Rosário e as Folias de Reis, bem como a diversidade e riqueza impressionante do artesanato do Vale do Jequitinhonha. (na foto acima do Nacip Gômez, São Gonçalo do Rio das Pedras, distrito do Serro)
Mais informações
          Para saber mais sobre o Caminho de Saint Hilaire, datas de roteiros, custo, hospedagem, alimentação, o que levar, quando ir, etc., entre em contato com a organização através do site ww.caminhosainthilaire.com.br (na foto acima de Giselle Oliveira, artesanato com flores de Sempre-vivas em Diamantina)
Quem foi Saint-Hilaire
          Augustin François César Prouvençal de Saint Hilaire (Orleans, 4 de outubro 1779 – Orleans, 3 de setembro de 1853), foi um naturalista, botânico e viajante francês que esteve no Brasil, entre 1816 e 1822.
          Veio junto com vários outros cientistas, com o objetivo de fazer expedições pelo território brasileiro, quando da mudança do Reino Português para o Brasil. Entre os cientistas que aqui chegaram, no século XIX, Saint-Hilaire foi o mais empenhado em suas expedições e o que mais se destacou nas pesquisas sobre a fauna e flora brasileira.
          Nos seis anos em que esteve no Brasil, Saint Hilaire percorreu 16 mil quilômetros a cavalo e até mesmo, a pé.
        Saint-Hilaire percorreu várias cidades brasileiras da Bahia, Goiás, Rio de Janeiro e principalmente Minas Gerais, que recebeu atenção especial do cientista devido sua fauna e flora diversificada.
          O naturalista francês esteve no Santuário do Caraça em Catas Altas, Serra do Cipó, Serra da Canastra, Serra da Mantiqueira e Serra do Espinhaço, visitando cidades próximas, bem como várias outras cidades mineiras como Diamantina, Conceição do Mato Dentro, Formiga, Paracatu, Araxá, Uberaba, Baependi, Sabará, Passa Quatro, dentre outras tantas.
          Como resultado de suas expedições, foram mais de 30 mil amostras colhidas, nos seis anos de estudos, além de 24 mil espécies de plantas e 6 mil espécies de animais identificados, sendo 2 mil aves, além de 16 mil insetos e 135 mamíferos estudados.
          Saint-Hilaire deixou um vasto legado de estudos e pesquisas, bem como suas impressões sobre o estilo de vida e costumes do povo brasileiro. Estudos e impressões de grande importância, até os dias de hoje.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Cachoeira do Campo: o embrião do nascimento de Minas

(Por Arnaldo Silva) Quem vai a Ouro Preto passa, necessariamente, pela BR-356 – a Rodovia dos Inconfidentes. Em todo seu trecho, até a cidade Patrimônio Cultural da Humanidade, desde 1980, montanhas, matas nativas, lagoas e rios, enchem os olhos dos viajantes.
          Mais que isso, a estrada margeia cidades e distritos, onde à vista, um pouco de sua arquitetura e artesanato em cerâmica, pedra sabão e em madeira, imagens sacras, além frutas nativas, queijos, cervejas artesanais, cachaças, doces e até museus, como o Jeca Tatu, em Itabirito e o Museu das Reduções às margens da Rodovia, em Cachoeira do Campo, a 22 km antes de chegar a Ouro Preto. (fotografia acima de Ane Souz)
Passam e geralmente, não param. Mas deviam.
          Além de ser um dos mais antigos distritos de Ouro Preto, Cachoeira do Campo tem história na origem de Minas Gerais. Não é apenas mais um povoado a beira de estrada. É uma parte da história do nascimento de Minas Gerais.
          Cachoeira do Campo tem cerca de 8.500 habitantes. Conhecida por seu clima ameno e saudável, considerado um dos melhores climas do Brasil, oferece uma boa qualidade de vida, segurança e tranquilidade aos seus moradores. (na foto acima de Vinícius Barnabé/@viniciusbarnabe, a Rodovia dos Inconfidentes, no Funil)
          
Seu comércio rico e variado, além do distrito contar com indústrias diversas como a moveleira e mineradoras. Conta ainda com uma boa estrutura urbana e prestação de serviços de qualidade, ótimas opções de hospedagem e gastronômica, com restaurantes, padarias e lanchonetes encontradas com facilidades.
Origem
          O povoado do que é hoje Cachoeira do Campo, tem origem nas últimas décadas do século XVII, com a chegada à região das bandeiras chefiadas por Fernão Dias, por volta de 1674/75. As tropas pararam próxima a uma cachoeira de águas limpas, em volta a um campo rupestre, na parte alta de uma serra, conhecida hoje por Serra do Trino, onde exatamente está o Colégio Dom Bosco.
          Daí a origem do nome. Inicialmente, Cachoeira, passando a se chamar, Cachoeira o Campo desde o século XVIII. (na fotografia acima do Vinícius Barnabé/@viniciusbarnabe, a Cachoeira Cascaa Dom Bosco)
          Fernão Dias e suas bandeiras não fixaram residência na região, partindo pouco tempo depois. Segundo a história, seu primeiro morador foi Manuel de Mello, que chegou à região por volta de 1680.
Além da das margens da rodovia
          Por sua origem e histórica, Cachoeira do Campo guarda verdadeiras joias de nossa história, pouco conhecida pelos turistas que vão à Ouro Preto.
          Passam pela Rodovia dos Inconfidentes rumo a Ouro Preto e apenas passam, não entram no distrito. Deixam de conhecer os encantos e a história de uma das mais antigas e importantes povoações mineiras.
          Além disso, como verão no decorrer da matéria, Cachoeira do Campo foi o embrião do nascimento de Minas Gerais. (na foto acima do Vinícius Barnabé/@viniciusbarnabe, o curso d´água da Cachoeira da Cascata, passando por debaixo da Ponte de Pedras)
O que ver e o que fazer em Cachoeira da Campo?
A Matriz de Nossa Senhora de Nazaré
          Os portugueses trouxeram a devoção à Nossa Senhora de Nazaré, quando de sua chegada à Cachoeira do Campo, ainda no final do século XVII. Pela fé, ergueram uma pequena ermida, dedicada à santa de devoção no povoado em formação. (fotografia acima de Leandro Leal)
          Um cruzeiro todo em pedras de cantaria, muito bem encaixada, construído em 1799 é marco da fé do povo de Cachoeira do Campo, instalado na Praça da Matriz da Igreja de Nossa Senhora de Nazaré.
          A matriz tem cinco imponentes e impressionantes altares, muito bem trabalhados, em finíssimas talhas e com riquíssimos elementos artísticos, talhados em madeira e ouro puro. (na foto acima e abaixo de Ane Souz, altar-mor e o forro da Matriz)
          Iniciada nos primeiros anos do século XVIII e concluída antes de 1730, substituindo a pequena ermida. Tem em sua arquitetura, riscos e traços do estilo predominante da primeira fazer do Barroco Mineiro, o Nacional-português. 
          Sua arquitetura singular, reflete as características que definiram o estilo das igrejas mineiras: simplicidade por fora e uma estupenda riqueza por dentro como podem ver na foto acima da Ane Souz.
          A Igreja de Nossa Senhora de Nazaré teve grande importância na história da formação de Minas Gerais por ter sido palco de batalhas da Guerra dos Emboabas (1707-1709) e da Sedição de Vila Rica ou Revolta de Filipe dos Santos (29/06 a 19/07 de 1720).
          Além disso, a Matriz tem enorme valor arquitetônico e cultural para Minas Gerais e para o Brasil. Por esse motivo, foi reconhecida em 1950, pelo Instituto Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), como patrimônio brasileiro.
Governadores e o Imperador na Matriz
          Sua importância era tanta que os governadores da Capitania de Minas Gerais, faziam questão de assistirem as missas na Matriz de Nazaré. Naquela época, Vila Rica (hoje, Ouro Preto), era a Capital da Capitania de Minas Gerais.
          O Imperador Dom Pedro II (1825-1891), foi também um dos visitantes ilustres da Matriz de Nazaré, estando presente em Cachoeira do Campo e na Matriz, em 1881.
          Dom Pedro II veio à Minas Gerais para uma série de visitas às cidades mineiras, entre elas, Vila Rica. A comitiva imperial saiu do Rio de Janeiro em 26 de março de 1881. Vieram de trem até Barbacena e desta cidade, seguiram em carruagens e em cavalos, para Vila Rica.
          Chegaram em Cachoeira do Campo em 2 de abril de 1881, causando um grande alvoroço na população local, que esperava comitiva no adro da Matriz.
          Dom Pedro II e sua esposa, D. Teresa Cristina, ficaram deslumbrados com o altar da Matriz de Senhora de Nazaré. Visitaram o Palácio da Cachoeira e o Colégio Dom Bosco.
          A área do Colégio impressionou o Imperador, que demonstrou a intenção de transformar o local numa escola agrícola.
          No almoço servido à comitiva imperial, Dom Pedro II fez questão de sentar-se na cadeira em que seu pai, o Imperador Dom Pedro I, sentou, quando também visitou o distrito, em uma de suas viagens à Minas Gerais. A cadeira, encontra-se hoje guardada no Centro Dom Bosco.
Outros atrativos de Cachoeira do Campo
Igrejas históricas
          
Além da Matriz de Nossa Senhora de Nazaré, outras igrejas de grande valor histórico são atrativos no distrito como a a primeira Igreja no Brasil dedicada à Nossa Senhora das Dores (na foto acima de Arnaldo Silva), construída em 1767.
          Tem ainda a Igreja de Nossa Senhora das Mercês, construída em 1908 e a Igreja de Nossa Senhora do Bom Despacho, construída em meados do XVIII (na foto acima de Ane Souz)
          Essas três igrejas não estão abertas à visitação, em seu interior, apenas a Matriz de Nazaré, abre para visitação pública de terça-feira a sábado, entre 14h e 18h.
O chafariz
          Imponentes casarões, estâncias e construções suntuosas, para a época, marcam a arquitetura de Cachoeira do Campo como por exemplo o Chafariz de Dom Rodrigo na Serra do Ouro Preto, construído no século XVIII para levar água potável ao distrito. Construção tão bem feita que está ativo até os dias de hoje.
O Palácio da Cachoeira
          Para se ter ideia da importância e a tradicional qualidade de vida oferecida no distrito, em Cachoeira do Campo, foi construído em 1773, a mando de D. Rodrigo de Menezes, um imponente e luxuoso casarão, para ser residência oficial dos governadores da Capitania de Minas Gerais. É o Palácio da Cachoeira, no popular, Palácio dos Governadores.
          Na capital, Vila Rica, os governadores despachavam do Palácio do Governo, mas para residir, optavam pelo Palácio da Cachoeira, longe da agitação da mineração e clima bem úmido de Vila Rica, na época, uma das maiores cidades das Américas.
A ponte de pedras
          O acesso ao palácio era feito por uma ponte de 30 metros de comprimento, em pedra bruta assentada com argamassa e sangue de boi, como aglomerante. Foi construída na mesma época do palácio, no século XVIII. (fotografia acima de Arnaldo Silva)

O refúgio da aristocracia
           Com a presença da pompa e luxo da governança, poderosos ricaços da época, fizeram o mesmo, construíram moradias do distrito.
          Por suas características climáticas e belezas naturais, além da presença da governança no distrito, poderosos ricaços aristocratas da época, fizeram o mesmo, começaram a construir moradias em Cachoeira do Campo. Com isso, o distrito tornou-se, no século XVIII, um dos refúgios dessa nova classe, que se formava, graças à riqueza proporcionada pelo Ouro.
           Infelizmente, boa parte desses casarões não estão mais em pé. Os que restaram, contam a história da imponência da aristocracia mineira, durante o Ciclo do Ouro. A antiga morada dos governadores resiste ao tempo.
          A partir de 1811 o antigo palácio passou a ser um internato para meninas, sobre a direção das Irmãs Salesianas. Hoje, funciona no local o colégio Nossa Senhora Auxiliadora e o Retiro das Rosas, usado como um pequeno centro de convenções, muito procurado para retiros espirituais e congressos.
O Colégio Dom Bosco
          Outro atrativo é o antigo Quartel do Regimento Regular de Cavalaria de Minas Gerais, a célula-mãe da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais. Instalado em 9 de junho de 1775, a mando do Governador Dom Antônio de Noronha, tinha como missão principal, guardar as recém descobertas minas de ouro de Vila Rica. (fotografia acima de Arnaldo Silva)

          Antes da instalação do regimento, no local funcionava o Quartel dos Dragões Del´Rey, guarnição que Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, era lotado, na patente de alferes, nos dias de hoje, um tenente.
          Em 1816, o local foi adaptado para receber a Coudelaria Imperial, instalada em 29 de julho de 1819, transformando-se no maior centro de treinamento, criação, seleção e aperfeiçoamento de cavalos de raças, da província mineira.
          Em 1834, já no fim do Ciclo do Ouro, o Regimento Regular de Cavalaria de Minas Gerais foi deslocado para o Rio de Janeiro e transformado no Primeiro Corpo de Cavalaria do Exército.
          Com isso, o espaço foi adaptado para ser um internato para meninos de todo o país, funcionando do século XIX, até a década de 1980, para este fim.
          O Colégio Dom Bosco, foi por décadas um dos mais tradicionais internatos para meninos do Brasil. Hoje, as instalações são usadas para congressos, encontros, simpósios e reuniões.
Educação e bandas musicais
          Cachoeira do Campo tem tradição na educação de qualidade. O primeiro grupo escolar no distrito foi fundado em 1907, em homenagem ao Padre Afonso de Lemos. Hoje, é uma escola estadual de ensino fundamental e médio.
          Desde o século XIX, as tradicionais bandas musicais compõem o cenário cultural do distrito e permanecem ainda na ativa. Como destaque a Banda Euterpe Cachoeirense, criada em 1856 e a Sociedade Musical União Cachoeirense, hoje, Sociedade Musical União Social, fundada em 1864. Inclusive, as duas bandas de Cachoeira do Campo estão entre as mais antigas bandas civis de Minas Gerais.
Festas populares
          Cachoeira do Campo se destaca em Minas por realizar um dos mais importantes festivais gastronômicos da Região, a Festa da Jabuticaba A festa acontece na época da temporada da fruta, entre novembro e dezembro.
          Destaque ainda para as festas de Nossa Senhora de Nazaré e a Festa do Cavalo, em julho.
O embrião do nascimento de Minas Gerais
A Guerra dos Emboabas

          Foi na Matriz de Nossa Senhora de Nazaré, em 1708, antes mesmo da conclusão das obras, que o português Manuel Nunes Viana, aclamado pelo povo, assumiu o cargo de primeiro Governador de Minas Gerais.
          Nessa época a Matriz de Nazaré era o centro do povoado e foi justamente em Cachoeira do Campo, que foi desencadeado um dos mais violentos confrontos da Guerra dos Emboabas (1708 – 1709), conflito entre portugueses e bandeirantes paulistas que queriam exclusividade na exploração das minas de ouro no território mineiro, bem como o monopólio no comércio de gêneros de primeira necessidade.
          Com esse objetivo, a Capitania de São Paulo estendeu seu domínio para a maior parte do território mineiro, adotando o nome de Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, bem como a Capitania do Rio de Janeiro, que anexou parte do território de seu território mineiro aos seus domínios.
          Mesmo tendo durado pouco mais de um ano, durante a Guerra dos emboabas, ocorrerem batalhas sangrentas, principalmente em Cachoeira do Campo.
          Com derrota dos bandeirantes paulistas, a Coroa Portuguesa passou a controlar de forma mais enérgica as atividades mineradoras e o comércio, bem como, taxar impostos e exercer uma constante e repressiva fiscalização na cobrança.
A Sedição de Vila Rica
          Evento histórico, ocorrido entre 29 de junho e 19 de julho de 1720, considerado o embrião para o nascimento de Minas Gerais. Teve seu ápice final no adro da Matriz de Nossa Senhora de Nazaré com a prisão de Filipe dos Santos (Portugal 1680 – Vila Rica, 1720).
          Filipe dos Santos veio para o Brasil, radicando-se em Vila Rica, no início do século XVIII, atuando como tropeiro, comerciante e político.
          Em Vila Rica, se destacou na liderança das camadas mais populares, encarnando a revolta da população contra os abusos cometidos pela Coroa Portuguesa, como por exemplo, as casas de fundição, criadas pela Coroa para fundir o ouro e controlar a extração mineral em Minas Gerais.
          Nessas casas, os mineradores tinham que levar o ouro extraído, que era fundido na casa e transformado em barras, cunhadas com o selo do Reino português. Essas barras eram enviadas para o porto de Paraty e de lá, para Portugal.
          Dos mineradores era cobrado uma quinta parte do ouro extraído, como imposto, chamado de Quinto. Isso equivaleria hoje a uma taxa de 20% do valor do bem.
          Para o povo e mineradores, uma taxa altíssima, diante de todas as dificuldades na extração e transporte do ouro, além do envio das riquezas para Portugal.
          Filipe dos Santos se revoltou contra o quinto e queria o fechamento das casas de fundição e formar um novo governo em Minas. Com este objetivo, liderou uma revolta popular conhecida como Sedição de Vila Rica e A Revolta de Felipe dos Santos.
          O movimento em si foi derrotado e Felipe dos Santos preso condenado à forca, por ordem de Pedro de almeida Portugal, o Conde de Assumar, então Governador da Capitania de São Paulo e Minas de Ouro.
          Mesmo não tendo jurisdição para essa ordem, Assumar não era juiz e nem fazia parte do judiciário à época, mesmo assim, sua ordem foi cumprida.
          Filipe dos Santos foi executado, retirado em seguida da forca e seu corpo amarrado pelas mãos e pés a quatro cavalos, sendo todo destroçado.
          Partes de seu corpo, foram penduradas em pedaços de madeira e espalhados pela cidade. Prática comum da Coroa Portuguesa na época, para intimidar e servir de exemplo a quem se atrevesse a ir contra as leis impostas pelos colonizadores, a seus colonos.
          Toda liderança do movimento foi presa, mas apenas o líder principal, Filipe dos Santos, foi condenado. Os outros líderes e revoltosos presos, foram perdoados.
          Embora a povoação de Minas Gerais tenha se iniciado a partir de meados do século XVII, o movimento liderado por Filipe dos santos, tornou-se o marco do nascimento oficial do Estado de Minas Gerais.
          A insatisfação popular com a presença cada vez mais crescente em Mina Gerais e ainda, ser extensão da Capitania de São Paulo, gerava cada vez mais revolta nos mineiros. 
          Alguns meses depois do fim da Sedição de Vila Rica, em 12 de dezembro de 1720, Minas Gerais tornou-se uma Capitania independente, separando-se de São Paulo, passando a ter domínio administrativo próprio, sobre seu território. Essa data é comemorada como a data da fundação do Estado de Minas Geais e fim da influência paulista em Minas Gerais.
          Nas origens de Minas Gerais, Cachoeira do Campo, foi um dos atores protagonistas do nascimento do estado mineiro.
A Praça Filipe dos Santos
          Em frente ao adro da Matriz, onde ocorreu a prisão de Filipe dos Santos, é uma praça hoje, com o nome de Filipe dos Santos. (fotografia acima de Arnaldo Silva)

          Além do adro, da Matriz e praça, o conjunto é formado por uma murada, coreto e casarões coloniais completando o cenário colonial.
Pare e entre em Cachoeira do Campo
          Quando vier à Ouro Preto, pare em Cachoeira do Campo e entre. Na rodovia, tem lojas diversas de artesanato em pedra sabão, como panelas, na foto acima do Arnaldo Silva e em madeira, como na foto abaixo, do mesmo autor.
          Entre no distrito, conheça as igrejas, o Colégio Dom Bosco, os casarões, a Ponte de Pedra. Almoce ou faça um lanche nos vários bares, lanchonetes e restaurantes do distrito.
          Conheça e vivencie um pouco de um lugar que gerou Minas Gerais, como Capitania autônoma e um estado dotado de uma imensa riqueza cultural, arquitetônica, cultural, natural e único no Brasil.

terça-feira, 30 de novembro de 2021

Copo Americano em Minas é Lagoinha. Entenda o motivo.

(Por Arnaldo Silva) Nas lanchonetes, padarias, restaurantes, nas mesas de bares e botecos, bem como, nas casas dos mineiros e brasileiros, está sempre presente, até mesmo em festas sociais, sendo inclusive, imprescindível nas medidas culinárias, com seus exatos 190 ml.
          É o copo Lagoinha, como é chamado em Minas Gerais, principalmente em Belo Horizonte. No Brasil, é conhecido por copo Americano, seu nome original. É um copo genuinamente brasileiro. (fotografia acima de Alexa Silva/@alexa.r.silva em Jaboticatubas MG)
          Copo americano, brasileiro ou mineiro? Se é brasileiro, porque tem o nome de Copo Americano? O que esse copo tem a ver com os Estados Unidos? Se o copo surgiu em São Paulo, o que tem a ver com Minas Gerais?
          Vamos as respostas. Não existe esse tipo de copo na América e com certeza, a maioria dos americanos sequer ouviu falar desse tipo de copo. É criação brasileira, criado pelas mãos de um mineiro, de São João Del Rei MG, cidade histórica nas Vertentes de Minas, distante 190 km de Belo Horizonte, com cerca de 90 mil habitantes.(fotografia de Clésio Moreira do 24º andar do condomínio do Edifício Super Building Valente, na Avenida Afonso Pena, Centro)
Nadir Figueiredo
          Seu criador foi Nadir Dias de Figueiredo, nascido em São João Del Rei, em 1891. Radicou-se em São Paulo, no início do século XX, com seus irmãos, em busca de uma vida melhor, já que veio de uma origem bem modesta. (na foto acima de Deividson Costa, vista parcial de São João Del Rei)
          Na capital paulista, tornou-se um dos maiores empresários do Brasil, se destacando no ramo da vidraçaria. Nadir Figueiredo faleceu em 10 de abril de 1983, em São Paulo.
          O copo Americano, que criou em 1947, foi uma de suas maiores e mais populares criações. Mas antes disso, Nadir Figueiredo já era um próspero e visionário empresário. Fundou uma oficina de conserto em máquinas de escrever em 1912. Alguns anos depois, passou a atuar no setor de eletrificação em sociedade com o irmão, Morvan Dias de Figueiredo.
          Em 1935, os irmãos decidiram investir no segmento de vidraçaria, adquirindo a empresa Cristaleira Americana, transformando-a no que é hoje a Nadir Figueiredo, empresa e marca que leva o nome do empresário, tornando-a uma das maiores e mais importantes empresas do Brasil, destaque inclusive no mundo. Em 2019, a empresa foi adquirida pela gigante americana de private equity HIG Capital.
A origem do copo Americano
          Nadir Figueiredo decidiu criar um copo que ao mesmo tempo fosse atraente e resistente. Ficou sabendo de um copo abaulado (em forma de curva) criado pela artista plástica russa, Vera Mukhina, no início da década de 1940.
          Nessa época, os copos eram muito frágeis, quebravam com facilidade, principalmente quando eram colocados nas rústicas máquinas de lavar louças, que existiam na extinta União Soviética. A artista criou o design de um copo justamente, para ser resistente e não quebrar com facilidade, quando colocadas nessas máquinas. E conseguiu.
          Foi nessa ideia da artista soviética que Nadir Figueiredo se inspirou para desenvolver o design de seu copo. Em viagem aos Estados Unidos, o empresário conheceu as vidraçarias americanas, seus produtos e a tecnologia disponíveis de ponta, da época.
          Voltou ao Brasil com ideia de criar um copo, inspirado no estilo soviético. Além disso, importou o maquinário dos Estados Unidos para São Paulo, dando início assim a concretização de sua ideia.
          Nadir Figueiredo, queria um copo no estilo abaulado, como o criado pela artista soviética, usando o que tinha de mais moderno da indústria americana, na época. Entre o maquinário de ponta que importou dos Estados Unidos, estava uma máquina que abaulava copos.
          Com a inspiração no design soviético, Nadir Figueiredo criou um copo versátil, resistente, confortável e que tivesse inúmeras utilidades, além de ter um custo mais acessível à população em geral. Isso porque, naquela época, copos de vidros eram mais restritos às camadas mais abastadas da sociedade.
          Além disso Nadir Figueiredo procurou adequar sua ideia à característica, cultura e costumes do povo brasileiro, que o empresário conhecia muito bem.
          Com base nesses critérios, criou um design genuinamente nacional, para atender os gostos e necessidades de todos os brasileiros.
          Todos os detalhes do copo foram pensados para dar mais resistência, utilidades diversas e versatilidade ao copo. Boca larga, com borda lisa, uma linha que circula a borda, separando a boca do restante do corpo do copo, que é todo chanfrado. Tudo isso, além de ser mais robusto que os demais copos, foi pensado para que o copo americano fosse resistente e cumprisse seus objetivos.
O motivo do nome copo Americano
 
          E cumpriu. O copo agradou e agrada até os dias de hoje. Por ter sido feito em máquinas que importou dos Estados Unidos, passou a chamar seu copo de copo Americano, mesmo tendo se inspirado no design de um copo soviético. E assim ficou o nome. (foto acima do Clésio Moreira)
O copo do mundo
          Copo Americano, criado por um mineiro, inspirado no design de um copo soviético, fabricado com maquinário Americano, numa fábrica paulista, que acabou se popularizando em Belo Horizonte e Minas Gerais com o nome de copo Lagoinha.
          Com todos esses atributos, não tinha como não ser um copo universal e tão popular assim.
          A produção inicial, em 1947, começou totalmente manual. As máquinas produziam apenas de 2 copos por minuto. Em 2012, a empresa comemorou 6 bilhões de unidades do copo Americano, vendidas em todo o mundo. Esses 6 bilhões de copos em fila, seria o equivalente a 10 voltas em torno do planeta Terra. (na foto acima da Aline Marrques, café da manhã do Chalé Cantinho de Minas, em São João Batista do Glória MG. E está o copo Lagoinha)
Símbolo nacional
          A popularidade desse copo é tanta e seu design, criado por Nadir Figueiredo, se tornou dos símbolos do design do Brasil, reconhecido no mundo todo. Tanto é que em 2009, o modelo tradicional do Copo Americano, foi exposto no Museu de Arte Moderna (MoMA) de Nova York. Méritos para Nadir Figueiredo, que deu ao Brasil, um produto que reflete a identidade e criatividade do povo brasileiro.
A chegada do Copo Americano em Minas Gerais
          A popularidade do Copo Americano em Minas Gerais, começou a partir do bairro boêmio da Lagoinha, em Belo Horizonte, nos primeiros anos da década de 1950.
          O nome Lagoinha tem origem nas lagoinhas formadas, durante a extração de rochas nesta região. Esta atividade existia antes mesmo da fundação do Curral Del Rei, povoado que deixou de existir para dar lugar à futura capital mineira, fundada em 12 de dezembro de 1897.
          Com a fundação de Belo Horizonte, a Lagoinha começa a ser povoada, se transformando em bairro.
          Até hoje, charmosas e bem trabalhadas, construções em estilo eclético das primeiras décadas do século XX, bem como construções modernistas, harmonizadas pela bela vista da Serra do Curral, que a região proporciona. (na foto acima do Thelmo Lins, Rua Além Paraíba no bairro Lagoinha)
          Estão presentes no tradicional bairro como o Cemitério do Bonfim (na foto acima do Thelmo Lins), a Igreja de Nossa Senhora da Conceição, o Conjunto IAPI, o Colégio Municipal, a Rádio Itatiaia, o Hospital Odilon Behrens, dentre outros antigos estabelecimentos e construções residenciais.
          Foi na Lagoinha que foi criada a Corporação Musical Nossa Senhora da Conceição, a primeira banda de música da cidade e ainda em atividade, bem como o Leão da Lagoinha, primeiro bloco de carnaval da capital mineira.
          O bairro concentra até os dias de hoje a maior diversidade religiosa de Belo Horizonte, com templos de diversas denominações religiosas convivendo democraticamente na região, bem como seus velhos e charmosos casarões em estilo eclético, mostrando o tempo do romantismo arquitetônico da capital mineira. Mas a região é famosa desde as primeiras décadas do século passado por sua agitada vida boêmia.
           A Lagoinha, juntamente com parte da região Central da Capital, a partir da Rodoviária e os bairros Bonfim, Carlos Prates, Colégio Batista, Pedreira Padro Lopes, São Cristóvão e Senhor dos Passos, formam a Região da Lagoinha.
O primeiro copo
          O primeiro estabelecimento a vender o Copo Americano foi o Armazém dos Irmãos Vaz de Mello, que funcionava na Rua Itapecerica, na esquina com a Avenida do Contorno, na Região da Lagoinha.
           Um dos irmãos, Joaquim Sétimo Vaz de Mello (“Seu” Quimquim), gostava de mostrar os atributos do copo, inclusive, batendo-o na bancada de madeira de seu armazém para mostrar aos fregueses que o copo não quebrava fácil. Com isso, além de versátil e multiuso, ganhou fama de copo inquebrável, tornando-se sucesso geral de vendas.
          Não demorou muito, para o copo cair no gosto dos donos de bares e botecos da região da Lagoinha, principalmente dos comerciantes da Praça Vaz de Melo, que na época, tinha uma vida boêmia muito intensa.
          O copo alegrava os ambientes dos bares e botecos, unindo sambistas, malandros, comerciantes, mulheres e pessoas de outras regiões que frequentavam a boemia belo-horizontina. As rodas de samba e bate papo entre amigos, corria a noite e o copo era o componente principal dessa socialização.
          Por isso, cada vez mais os pedidos de copos chegando ao ponto de ser tão popular, que o copo Americano foi associado e até mesmo, ser um símbolo da boemia belo-horizontina.
Aqui é copo Lagoinha! Aqui é Minas!
          Tanto é que ao invés de chamar copo Americano, era chamado de copo Lagoinha, por sua tamanha aceitação e popularidade nessa região.
          O nome copo Lagoinha passou a ser pedido para compras nos armazéns e no uso de botecos e bares. Não se pronunciava mais copo Americano.
           Com o passar do tempo, o copo Lagoinha começou a se expandir por outras regiões da Capital, passando a ser usado, nos demais bares e botecos da capital mineira, pelos restaurantes, padarias, lanchonetes, mercados e mercearias da cidade, além da população em geral. (fotografia acima de Clésio Moreira)
          A praticidade do Copo Lagoinha saiu das divisas de Belo Horizonte para todo o interior mineiro. Caindo de vez no gosto de todos os mineiros.
          Na década de 1980, foi criado o Complexo Viário da Lagoinha, ligando a Zona Norte-Sul com a Zona da Leste-Oeste de Belo Horizonte. Esse complexo foi construído onde era a efervescência da boêmia da capital. 
          Na medida que a construção foi avançando, os casarões, bares, botecos e comércios que existiam no local, foram dando lugar a um imponente complexo viário, com túneis, viadutos, rotatórias e novas ruas. Com isso, os anos da boêmia da Lagoinha, ficaram no passado, na história e imaginário do povo belo-horizontino.
Melhor copo do mundo para se tomar cerveja
          O Copo Lagoinha é tão popular em Minas Gerais, quanto a cachaça de Minas. Aliás, cachaça e Copo Lagoinha, tudo a ver. Cerveja também, claro. (fotografia acima de Alexa Silva/@alexa.r.silva em Jaboticatubas)
          Numa votação popular na década de 1990, o Copo Lagoinha foi eleito pelos belo-horizontino e mineiros, como o melhor copo para se tomar cerveja no mundo. É também o preferido nas mesas dos bares para se tomar a tradicional cachaça mineira. Cachaça e cerveja em copo que não seja o Lagoinha, perde a graça. Isso é fato!
          É um copo que simboliza e reflete claramente a cultura e os sabores do mineiro, já integrado no dia a dia do nosso povo. Sem nenhum projeto de marketing, tornou-se um dos símbolos da capital dos bares do Brasil, Belo Horizonte. Um símbolo que saiu das camadas populares e da boemia belo-horizontina, naturalmente, incorporando-se aos costumes da cidade e do nosso povo em geral.
          Mesmo com tantas opções de copos hoje disponíveis, nos mais diferentes designs e os preços mais em conta, o copo Lagoinha nunca deixou de estar nas casas brasileiras. E sempre estará. O copo é um símbolo da cultura, festas, tradições, folclore, costumes e alegria do povo brasileiro. Faz parte não só da cultura e costumes do nosso povo, mas de nossas emoções e sentimentos.
Campanha tornou o nome Lagoinha, oficial
          Em nenhum estado ou cidade brasileira, esse copo tem tanta importância como em Belo Horizonte. De tão importante, está enraizado na cultura e costumes da cidade, desde a década de 1950/60. É parte da vida e história do povo belo-horizontino e um ícone dos bares e botecos mineiros e também um ícone do Brasil. (fotografia acima de Alexa Silva/Alexa.r.silva) 
          Em 2019, numa campanha organizada pela Cervejaria Wäls, marca mineira de cervejas artesanais, para que a empresa Nadir Figueiredo, reconhecesse o nome Copo Lagoinha, como oficial, teve adesão do povo mineiro.
Foi feita uma petição que contou com ampla mobilização dos belo-horizontinos com efeito positivo. Isso porque a empresa aceitou a petição dos mineiros, reconhecendo que copo Americano, é também chamado de copo Lagoinha.
Enquanto o restante do Brasil chama o modelo de copo Americano, em Belo Horizonte o copo Lagoinha é unanimidade, o copo e o nome.
          Quando completou 20 anos, a própria cervejaria homenageou o copo Lagoinha, símbolo de Belo Horizonte, criando um rótulo personalizado (na foto acima do Thiago Andrade). Na descrição, a Wäls descreve a cerveja Copo Lagoinha como puro malte, não filtrada, aromática e refrescante, com baixo amargor. Foi feita sob medida para Belo Horizonte, a Capital Mundial dos botecos.
Da alegria à democracia
          Da pinga ao pingado, da água ao café, do suco ao refrigerante, ele está lá, presente. Sem contar nas rodas de amigos, nos bares, botecos e festinhas, tem sempre Copo Lagoinha presente. Se não tiver copo americano, qualquer churrasco ou roda de amigos e principalmente em bares e botecos, não tem graça alguma. (fotografia acima de Arnaldo Silva) 
          É o copo mais democrático e social que existe no Brasil. Na maioria das casas, das mais diferentes camadas sociais, em padarias, lanchonetes, bares, mercados públicos e restaurantes, simples ou sofisticados, tem copo Lagoinha.

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